Ação popular para anular decisão do Carf só cabe em caso de ilegalidade, decide STJ

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Por unanimidade, os ministros da 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiram que a ação popular para anular decisão do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) só é possível em caso de ilegalidade expressa ou contrariedade à jurisprudência em decisão do tribunal administrativo. Os magistrados deram provimento ao recurso da Fundação Armando Álvares Penteado (Faap), que defendia o descabimento da ação e a decadência do direito do fisco à cobrança de contribuições sociais.

A ação popular foi ajuizada por um auditor fiscal que discordou da decisão do Carf, que reconheceu a decadência do crédito tributário. A Faap foi autuada após a fiscalização constatar irregularidades que levaram à perda da imunidade tributária, e, consequentemente, do Certificado de Entidades Beneficentes de Assistência Social na Área de Educação (Cebas). A perda da imunidade está relacionada à discussão sobre a decadência, pois o fisco alega que o prazo de cinco anos só começou a contar depois que a entidade já não era imune. O fisco afirma que, antes, estava impedido de constituir o crédito tributário.

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Conforme a Fazenda, neste caso, é aplicável o artigo 173, I, do Código Tributário Nacional (CTN). O dispositivo prevê que o direito de constituir o crédito tributário se extingue após cinco anos, contados a partir do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado.

Porém, o Carf decidiu a discussão aplicando ao caso a Súmula 8 do Supremo Tribunal Federal (STF).O enunciado prevê ser inconstitucional a suspensão da prescrição dos créditos tributários prevista no artigo 5°, parágrafo único, do Decreto 1569/1977, bem como o prazo decadencial de 10 anos para a constituição do crédito no caso de contribuições previdenciárias, previsto nos artigos 45 e 46 da Lei 8.212/1991.

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O advogado do contribuinte, Marcelo Aparecido Batista Seba, defendeu em sustentação oral que a discussão passou por dois colegiados administrativos: a Delegacia da Receita Federal (DRJ) e o Carf. Segundo ele, a discussão não trata do artigo 173, I, do CTN, mas do que ficou sumulado pelo STF no que tange às contribuições à seguridade social.

Já o procurador Ricson Moreira Coelho da Silva, representante da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), defendeu a aplicação do artigo 173, I, do CTN. Além disso, defendeu o ajuizamento da ação popular para desconstituir a decisão do Carf no caso concreto, segundo ele por se tratar de situação “excepcional”, que envolve ato lesivo ao patrimônio público. Segundo o procurador, a Receita Federal realizou auditoria na Faap e encontrou situação “ao arrepio da lei”, com jatos particulares e hospedagens na Europa custeados pela instituição educacional.

Órgão da União

A relatora, ministra Regina Helena Costa, observou que o Carf tem a função de decidir acerca dos litígios tributários na esfera federal e suas decisões são dotadas de caráter definitivo, sejam contrárias ou favoráveis ao fisco. Além disso, pontuou que o tribunal administrativo é órgão componente da estrutura da União. Assim, suas decisões são imputáveis à pessoa jurídica da qual faz parte, ou seja, à própria União.

“Não se está a dizer que é incabível ação popular para rever ato do Carf e sim que, para que isso seja possível, é preciso verificar o cabimento da ação popular”, afirmou a ministra. Para a magistrada, não é qualquer decisão do Carf enseja ação popular, mas apenas aquelas eivadas de ilegalidade, abuso de poder ou que contrariam a jurisprudência consolidada.

A relatora adotou um tom crítico em relação ao caso concreto, destacando que o autor, um auditor fiscal da Receita Federal, assumiu que vem ajuizando diversas ações populares para combater “a farra do Cebas”. Segundo Costa, “em breve consulta ao sítio eletrônico do STJ, vislumbra-se pelo menos 200 recursos especiais no âmbito de ações populares interpostos pelo mesmo autor popular”. A ministra também observou que o auditor fiscal foi o responsável pela autuação do contribuinte no caso concreto.

Segundo a magistrada, o cargo de auditor fiscal não impede o uso da prerrogativa de ajuizar ação popular na qualidade de cidadão. Porém, ela avalia que o caso desse autor é excepcional e “pode importar em subversão da estrutura hierárquica e utilização da ação popular como instrumento de suposta vingança”.

O colegiado acompanhou o entendimento de Costa por unanimidade. O ministro Paulo Sérgio Domingues comentou que chamou sua atenção o fato de a Fazenda defender a posição do autor da ação popular. “Eu imaginaria ver a União defender a posição da União, do seu órgão administrativo que é o Carf. Não consigo ver coerência em ver a Fazenda defender posição pela anulação da decisão do seu órgão administrativo”, observou.

Ao JOTA , o procurador Ricson Moreira Coelho da Silva disse que esperava que a relatora se manifestasse sobre a aplicação do prazo decadencial nos termos do artigo 173, I, do CTN. Porém, disse que considerou positivo o fato de Regina Helena Costa não se manifestar contra o ajuizamento da ação popular em si, mas apenas em determinadas circunstâncias. Ele preferiu não comentar as observações do ministro Paulo Sérgio Domingues.

O caso foi julgado no REsp 1.608.161.