Sempre um evento econômico importante, os dados do PIB trimestral no período de julho a setembro tiveram nos números de investimento a mensagem mais preocupante. A queda de 2,5% seria ruim mesmo se fosse episódica, mas se torna ainda mais inquietante diante do fato de ser a quarta consecutiva e de que ficou quase 7% abaixo em comparação com igual período do ano passado.
Os números negativos não chegaram a surpreender o governo, mas reforçaram a convicção sobre a adoção da chamada “depreciação super acelerada”, um incentivo fiscal para estimular investimentos, sobretudo do setor industrial. Tanto que a CNI recebeu nesta quarta-feira (7) informação do governo de que um anúncio oficial sobre a retomada do programa será feito na semana que vem, na reunião do Conselho Nacional de Desenvolvimento Industrial (CNDI).
O JOTA apurou que a medida de fato está prevista para ser anunciada na próxima semana e a equipe econômica está finalizando questões como a definição de medidas compensatórias e o tamanho do impacto fiscal. O MDIC gostaria de uma política de R$ 14 bilhões em dois anos, mesmo que em 2024 o valor do orçamento seja menor.
Mas o Ministério da Fazenda, em sua busca pelo déficit zero, queria diminuir o número de segmentos beneficiados, de forma a conter o impacto fiscal. No campo das medidas compensatórias, o Imposto de Importação de alguns produtos da área de energia estava na mira.
Hoje, a depreciação do maquinário das empresas, para abatimento da base de cálculo do IRPJ/CSLL, varia de 2 a 25 anos. A ideia é que todo esse processo seja considerado em apenas um ano, concentrando todo o benefício tributário em um ou dois anos no máximo. A longo prazo, o impacto fiscal não muda, mas como há uma antecipação do desconto, isso precisa ser incorporado como renúncia no orçamento do ano, após a aprovação da medida provisória ou projeto de lei.
A depreciação acelerada não é unanimidade entre os economistas. Parte deles, inclusive no governo, enxerga o risco de se fazer um benefício fiscal que só vai elevar margem de lucro de empresas sem gerar efetivamente novos investimentos.
Mario Sergio Telles, gerente de economia da CNI, porém, defende que a medida é necessária para reduzir os custos de investimentos, que hoje sofrem com carga tributária e juros ainda altos. Ele salienta que não há impacto fiscal em uma análise mais alongada no tempo, dado que o incentivo no curto prazo é compensado por um recolhimento de IR mais alto nos anos seguintes.
Telles reconhece que a iniciativa pode gerar em alguns casos apenas antecipação de investimentos que seriam feitos de qualquer forma, mas aponta que isso não é regra geral. “Essa redução de custos pode ser a diferença entre fazer e não fazer um investimento dentro da equação financeira de uma empresa”, disse o economista. “Quando se reduz o custo do investimento, você induz algo que talvez não fosse acontecer”, completou o economista, lembrando que o maquinário industrial do país está envelhecido, com média de 14 anos.
Independentemente de críticas e elogios à ideia da depreciação acelerada, de forma geral o país precisa reverter essa trajetória de queda dos investimentos. Os sinais são de que, por uma série de fatores, como as reformas feitas ao longo dos últimos seis anos e o retorno das políticas de demandas, o PIB está crescendo mais e gerando até um debate sobre se o potencial de crescimento do país está maior do que o mercado estima. Mas se o investimento continuar em queda, a capacidade de avançar do país vai diminuir e isso precisa ser revertido.
Certamente a medida a ser anunciada na próxima semana não vai, sozinha, endereçar esse problema. Um diagnóstico correto sobre o que tem acontecido nos últimos trimestres nessa rubrica das contas nacionais é necessário para calibrar a reação do governo e para que políticas de estímulo ao investimento não se tornem contraproducentes.
Hipóteses como juros muito altos e as incertezas fiscais, que sustentam juros de longo prazo altos, e tributárias, dado o caminho de se fazer um ajuste no lado das receitas, também estão sendo elencados dentro e fora do governo como motivadores para o deprimente quadro dos investimentos. Provavelmente o que está acontecendo é um reflexo da soma desses fatores, com o tempo mostrando qual tem mais peso no quadro atual.
No caso dos juros, a trajetória da Selic em queda ajuda a resolver o problema e o espaço para que isso continue a ocorrer está sendo conquistado com a forte queda dos índices de preços neste ano. O risco de um orçamento de redução mais curto por parte do BC, contudo, está no radar e pesa nas decisões empresariais. De outro lado, os juros futuros mais altos, temendo um BC mais leniente com a inflação a partir de 2025, reduzem o impacto dos cortes feitos e que ainda virão.
Na questão fiscal, o governo precisa conseguir não só conquistar a confiança de que produzirá uma trajetória consistente de redução do déficit, como defende o ministro Fernando Haddad, mas reduzir os ruídos constantes. Caminhar para manobras interpretativas sobre o arcabouço fiscal, como na discussão sobre o possível contingenciamento, e periodicamente reavivar a discussão das metas fiscais sem nunca resolver em definitivo o assunto não ajuda a reduzir a incerteza e contribui para postergação de planos de expansão das empresas.
A questão tributária, que está intimamente ligada à fiscal, também é um elemento perturbador para os rumos dos investimentos no país. Independentemente de boa parte da agenda de Haddad no tema tributário ser meritória, corrigindo distorções do passado, o impacto efetivo das medidas é uma redução de caixa das empresas. Além disso, a incerteza sobre qual o tamanho do impacto final das medidas e se a caixa de ferramentas dos impostos continuará aberta após tudo que foi aprovado neste ano também faz as empresas jogarem na retranca.
Certamente há outros fatores pesando na queda contínua dos investimentos. As dúvidas sobre se as demandas externa e interna terão bom desempenho nos próximos meses e anos, por exemplo, são importantes definidores das estratégias de quem amplia sua capacidade produtiva.
Seja como for, estancar e reverter essa trajetória negativa dos gastos em ampliação da capacidade produtiva é uma tarefa urgente.
Para além das questões acima listadas, temas como a agenda de transição energética e ecológica, política de barateamento do hedge cambial para investimento estrangeiro direto no país e o PAC, se for executado com eficiência e inteligência, podem ajudar nessa virada. Se o investimento não voltar a crescer, e com vigor, mesmo que o PIB ainda apresente algumas boas taxas trimestrais, a batida no muro será inevitável.