A fome no Brasil tem cara de mulher preta

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Quando falamos sobre desigualdade, vulnerabilidade e pobreza, não podemos ignorar o impacto desproporcional que esses fatores têm sobre as mulheres negras. Elas são frequentemente mães solo, trabalhadoras domésticas, subempregadas, desempregadas e, muitas vezes, vítimas de violência doméstica. Esta realidade se estende também às mulheres dos campos, florestas, ribeirinhas, quilombolas, a despeito de sua importância vital para a preservação ambiental. Se há floresta em pé, é porque há mulheres lutando por isso.

A reforma tributária que discutimos no cenário atual representa uma oportunidade significativa para abordar essas desigualdades de maneira estrutural. Trata-se de uma chance para avançarmos não apenas no combate à desigualdade, mas também na justiça climática. A reforma nos permite considerar uma transição energética que não deixe ninguém para trás, especialmente as pessoas mais pobres. É a chance de fortalecer o estado, visando uma arrecadação mais eficiente e garantindo direitos fundamentais, como acesso à saúde, educação e assistência social, principalmente para as pessoas em vulnerabilidade.

Para mensurar a profundidade da desigualdade no Brasil, recorro ao relatório publicado pela Oxfam, no início deste ano, que destaca como o poder corporativo contribui para a divisão econômica no mundo. Entre 2020 e o presente, 4 dos 5 bilionários brasileiros aumentaram suas riquezas, enquanto mais de 129 milhões de brasileiros ficaram mais pobres. Essa discrepância é alarmante e sublinha a necessidade urgente de discutir a desigualdade de maneira mais ampla, e não apenas a pobreza.

Dados do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea) mostram que, apesar dos avanços no combate à insegurança alimentar no governo Lula, 21 milhões de pessoas ainda enfrentam a fome no Brasil. A maioria são mulheres negras. A fome no Brasil tem um rosto, e é o rosto de uma mulher preta.

Por isso, a reforma tributária precisa incluir medidas que abordem diretamente a fome, como o mecanismo do cashback, que deve ser ampliado para alcançar 100% das pessoas com renda de até um salário mínimo, garantindo a essas famílias a chance de conseguir  investir no desenvolvimento de suas capacidades. Percentuais aquém deste não são suficientes para garantir uma vida digna.

Proporcionar o cashback de 100% é um passo crucial para alcançar a justiça social e econômica. Quando essas famílias têm acesso a mais recursos, elas podem gastar com educação, saúde e bem-estar, contribuindo para um Brasil mais forte e justo.

A luta por justiça para a população negra no Brasil é histórica. Desde a fundação do estado brasileiro, baseada na escravidão, a população negra espera por reparação. A escravidão não só explorou e desumanizou pessoas, mas também gerou lucros significativos para o estado. A reforma tributária, portanto, oferece uma oportunidade única para o Brasil reparar esses danos históricos. Já aprendemos que quem tem fome tem pressa. Chega de adiar essa transformação essencial.