2023, um ano para o consumidor de energia esquecer

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Chegamos ao tradicional momento das retrospectivas do ano. Para o setor elétrico, 2023 foi um ano com fortes emoções e a boa notícia foi que tivemos um período chuvoso altamente satisfatório. Chegamos em dezembro, final do período seco, com índices elevados nos reservatórios, com 63,7% de armazenamento, depois de atingir seu ápice no final de março, com impressionantes 85,3% de armazenamento no Sistema Interligado Nacional (SIN), considerado o melhor nível para o início do período seco desde 2007.

No entanto, quando avaliamos as decisões nas mais diversas esferas, o cenário muda. Em 2023 tivemos o desenrolar dos processos atinentes às térmicas do Processo Competitivo Simplificado (PCS), que ocorreu em 2021, devido à iminente crise hídrica vivenciada pelo país, onde se realizou uma contratação a valores elevadíssimos para que as usinas entrassem no curto prazo. A maioria delas não conseguiu seguir as regras do leilão e, ao contrário da lógica, o contrato não foi cumprido e, mesmo assim, algumas conseguiram gerar, imputando custos bilionários aos consumidores.

Das decisões tomadas, a que mais impactará a tarifa do consumidor é o caso da geração das usinas da KPS, também contratadas via PCS. Apesar do descumprimento do contrato, o TCU decidiu manter as quatro usinas gerando, garantindo o período de suprimento por 44 meses, o que faz com que seja necessário alterar a data de fim do suprimento para maio de 2026.

Além dessa alteração, houve a redução da inflexibilidade de três das quatro usinas a zero, restando apenas a UTE Karkey 013, com uma geração na base de 29 MW médios, imputando um custo bilionário aos consumidores: R$ 9,2 bilhões. Em contrapartida, se o contrato tivesse sido respeitado e a Aneel rescindido o mesmo, os consumidores não iriam pagar nenhum valor e ainda receberiam R$ 1,114 bilhão via redução de encargo.

Outro tema polêmico deliberado neste ano, que resultará em mais custos para os consumidores, é a decisão final tomada pelo STF em prol das usinas a óleo combustível e a óleo diesel que participaram do 1º Leilão de Reserva de Capacidade, ocorrido em dezembro de 2021. O Supremo permitiu a homologação dos contratos dessas usinas existentes, em operação há mais de 15 anos, gerando um custo ao consumidor de R$ 582 milhões por ano até 2041, além do custo adicional de R$ 1,1 milhão/hora quando forem ligadas, devido ao alto CVU dessas usinas.

Essa decisão só foi possível porque as diretrizes do leilão não foram bem definidas, não havendo uma restrição clara à participação de fontes que utilizassem combustíveis a óleo diesel ou combustível, em linha com os princípios de descarbonização da matriz elétrica, apenas uma trava atrelada ao CVU, que foi prontamente questionada, baseado no entendimento de que ao estabelecer tal limite, impõe-se uma barreira que poderia impedir a contratação de usinas que resultaria em um custo final global mais barato ao consumidor.

Além desses vultuosos custos que serão arcados pelos consumidores, que já convivem com tarifas muito elevadas, tramita no Senado o PL 11.247/2018, denominado PL das Eólicas Offshore, que teve seu objetivo principal desviado na Câmara dos Deputados para abarcar diversos benefícios a segmentos específicos que tendem a encarecer cada vez mais a conta de energia do consumidor brasileiro.

Da estimativa realizada pela Abrace Energia, todos esses penduricalhos custarão anualmente entre R$ 32,8 bilhões e R$ 43,3 bilhões por ano, considerando a obrigação de contratação de contratação de 9.700 MW, com alteração do critério de preço do combustível. Isso possibilita a inclusão dos custos de transporte do gás natural até as usinas térmicas na conta do consumidor, usinas hidrelétricas de até 50 MW, eólicas na região Sul e térmicas utilizando como combustível o hidrogênio líquido, além da extensão até 2050 dos contratos em vigência de usinas térmicas movidas a carvão mineral nacional, alterações nos critérios de renovação do PROINFA e extensão de prazos para Micro e Minigeração (MMGD).

Diante de tantas distorções e considerando que hoje o Brasil já ocupa o primeiro lugar no ranking de países com a maior tarifa de energia elétrica entre os 34 países da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), será que realmente é uma boa decisão imputar cada vez mais custos compulsórios a um setor que hoje está disfuncional e que convive com enormes custos adicionais na tarifa?

A resposta parece óbvia, mas os movimentos seguem na direção de aumentar cada vez mais os custos, onerando ainda mais a sociedade brasileira e tornando a indústria nacional cada vez mais competitiva.