Tributos saudáveis: imposto seletivo em defesa do direito à saúde

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A criação de um imposto seletivo para produtos e serviços nocivos à saúde e ao meio ambiente se destaca entre as propostas contidas na reforma da tributação do consumo recentemente aprovada pelo Senado. Em linhas gerais, trata-se de tributar mais pesadamente artigos como tabaco, álcool, alimentos ultraprocessados e agrotóxicos como forma de compensar as externalidades negativas ocasionadas pelo consumo desses bens, em especial relacionadas ao direito à saúde.

As evidências científicas quanto à correlação entre doenças crônicas não transmissíveis (DCNTs), o impacto respectivo nas contas públicas e tais produtos são vastas – mais de 70% das mortes no Brasil são resultantes do consumo de tais bens. De outro lado, a tributação como instrumento de promoção do direito à saúde tem sido utilizada internacionalmente com relativo sucesso. No Brasil, inclusive, não há dúvidas quanto à adequação da política de tributação do tabaco como meio de redução do consumo e iniciação de crianças e adolescentes.

É justamente nesse contexto, com o objetivo de contribuir com tal debate, que lançamos a obra Tributos Saudáveis – Diálogo entre direito, saúde e economia, pela Thomson Reuters – Revista dos Tribunais, com apoio da ACT Promoção da Saúde, instituição da sociedade civil que há mais de 16 anos incentiva políticas públicas para o controle do tabaco e do álcool e o estímulo à alimentação saudável.

Nesse sentido, destaque-se que o termo “tributo saudável” tem sido usado nacional e internacionalmente em referência à tributação onerosa sobre produtos nocivos que impactam negativamente a saúde pública, os quais não são essenciais à vida humana e provocam danos aos consumidores e externalidades negativas com consequências social, ambiental e economicamente indesejáveis.

Com 12 artigos de juristas e especialistas de diferentes áreas do conhecimento, o objetivo geral da obra é provocar a reflexão sobre o uso da tributação como política de redução do consumo de bens nocivos à saúde, com a intersecção desse debate com a economia e a saúde pública. Denise Lucena, professora de direito tributário da Universidade do Ceará (UFC), e Diogo Coutinho, professor de direito econômico da Universidade de São Paulo (USP), assinam os prefácios.

O livro aponta ainda saídas para o financiamento do Sistema Único de Saúde (SUS) e sugere estratégias para facilitar o acesso da população à alimentação de qualidade. Nesse sentido, defende-se que os recursos obtidos com o aumento da arrecadação deveriam ser usados no tratamento das DCNTs, ao lado da inexistência de quaisquer benefícios tributários para bens nocivos à saúde. Especificamente no caso da alimentação, devem ser criadas ferramentas para desonerar o preço final dos alimentos in natura.

Por fim, a obra tem como argumento central o fato de que alegações relacionadas a um suposto paternalismo estatal em detrimento da autonomia do indivíduo devem ser superadas. O debate deve se situar em torno do direito à saúde e dos impactos públicos que o consumo de bens nocivos causa. Mantemo-nos firmes na convicção de que a Constituição da República de 1988 pressupõe a formulação de políticas públicas para a concretização do Estado social e democrático de Direito, o que também pressupõe um sistema tributário que impulsione a saúde e atue na preservação do meio ambiente.