Trabalho, tecnologia e risco: a agenda empresarial que 2025 deixou clara

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2025 foi o ano em que o Direito do Trabalho  revelou, sem disfarces, sua maior fragilidade contemporânea: a dificuldade de lidar com a realidade econômica sem recorrer a atalhos conceituais do passado.

Enquanto empresas avançaram em modelos de negócio baseados em tecnologia, eficiência e reorganização produtiva, a resposta institucional oscilou entre tentativas de modernização e recaídas em um protecionismo que confunde tutela com imobilismo. O resultado foi um ambiente de alto risco regulatório, no qual a insegurança jurídica passou a ser o principal “custo invisível” das relações de trabalho.

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O debate sobre plataformas digitais sintetizou esse dilema. O STF assumiu, em 2025, o protagonismo ao iniciar o julgamento com repercussão geral sobre a existência — ou não — de vínculo de emprego entre motoristas e plataformas, deslocando o centro da discussão do plano moral para o plano estrutural.

O que se discute ali não é apenas a aplicação da CLT, mas se o Estado brasileiro será capaz de construir soluções jurídicas compatíveis com modelos econômicos que não se organizam mais em torno da subordinação clássica. Forçar a equiparação automática entre plataformas e empregadores tradicionais não é proteção social; é negar a realidade produtiva. A livre iniciativa não é um privilégio constitucional decorativo — ela é pressuposto para geração de renda, inovação e, paradoxalmente, para a própria sustentabilidade do emprego.

No entanto, enquanto o STF demonstrou cautela institucional — adiando decisões e reconhecendo a complexidade sistêmica do tema —, o Tribunal Superior do Trabalho seguiu caminho diverso em 2025. O avanço dos Incidentes de Recursos Repetitivos (IRRs) no TST passou a preocupar seriamente empresas, RHs e departamentos jurídicos.

A promessa de uniformização jurisprudencial, que deveria servir à segurança jurídica, frequentemente se converteu em padronizações rígidas, pouco sensíveis às especificidades setoriais e à diversidade dos modelos empresariais.

Em vários temas estratégicos — terceirização, pejotização, remuneração variável, controle de jornada em ambientes híbridos, enquadramento sindical e responsabilidade em cadeias produtivas — os IRRs passaram a funcionar, na prática, como atalhos normativos: decisões com vocação quase legislativa, mas sem o debate democrático e sem análise adequada de impactos econômicos.

A crítica aqui não é ao instrumento em si, mas ao seu uso. Quando o TST transforma casos complexos em “teses gerais”, corre-se o risco de cristalizar entendimentos que simplificam excessivamente a realidade empresarial, reforçando presunções contra o empregador e enfraquecendo a análise concreta do caso.

O problema se agrava quando esses incidentes dialogam mal com a jurisprudência do STF. 2025 escancarou um desalinhamento institucional preocupante: enquanto o Supremo caminha para uma leitura mais funcional da livre iniciativa e da autonomia privada, o TST, em certos IRRs, parece reafirmar uma visão quase automática de fraude sempre que há inovação contratual. Esse descompasso não protege o trabalhador — ele desorganiza o sistema, incentiva litigância defensiva, eleva o custo Brasil e desestimula modelos legítimos de contratação.

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O mesmo padrão apareceu no debate sobre pejotização. O STF sinalizou, ao reconhecer repercussão geral e suspender processos, que pretende enfrentar o tema com racionalidade econômica e constitucional. Já no âmbito infraconstitucional, parte da jurisprudência trabalhista insistiu em tratar a contratação via pessoa jurídica como suspeita por definição, ignorando que há setores inteiros — tecnologia, consultoria, economia criativa — cuja lógica produtiva simplesmente não se encaixa no molde celetista tradicional.

O resultado é perverso: empresas que estruturam relações autônomas legítimas passam a operar sob constante ameaça, enquanto o verdadeiro foco — a fraude mal desenhada — se dilui.

Esse mesmo viés reapareceu em 2025 nas discussões sobre trabalho em feriados, jornada e escalas. A retomada de exigências formais para funcionamento do comércio em feriados foi vendida como fortalecimento da negociação coletiva, mas, na prática, revelou uma visão pouco conectada à dinâmica do consumo, da logística e dos serviços. O discurso de proteção muitas vezes ignora que sem operação não há emprego, e que rigidez excessiva não gera dignidade — gera informalidade.

No campo da gestão de pessoas, 2025 também marcou a transição definitiva de temas como saúde mental, assédio e riscos psicossociais do plano retórico para o plano regulatório. A atualização da NR-1 e o foco em riscos psicossociais não devem ser lidos como mais um avanço do paternalismo estatal, mas como um convite — quase uma imposição — à profissionalização da gestão.

Empresas eficientes entenderam rapidamente: saúde mental não é benefício, é gestão de risco. Organizações que ignoram esse tema não estão sendo “duras”; estão sendo ineficientes, abrindo espaço para passivo, queda de produtividade e crises reputacionais.

A agenda de transparência salarial seguiu a mesma lógica. A prorrogação do prazo para divulgação dos relatórios não eliminou o ponto central: remuneração sem critério virou um risco jurídico concreto. Aqui, 2025 deixou uma lição empresarial clara: transparência não é inimiga da livre iniciativa; é sua aliada. Ela reduz arbitrariedade, fortalece governança e protege a empresa contra litígios oportunistas.

Por fim, a inteligência artificial entrou definitivamente no radar trabalhista. O lançamento de diretrizes para governança de IA no ambiente de trabalho mostrou que o debate não é se a tecnologia deve ser usada, mas como. Empresas que tratam IA sem método criam riscos jurídicos novos; empresas que estruturam governança, comitês, auditoria e supervisão humana transformam tecnologia em vantagem competitiva. Livre iniciativa, aqui, não é improviso — é responsabilidade técnica.

A grande mensagem de 2025 é incômoda, mas necessária: o Direito do Trabalho brasileiro não pode continuar reagindo à inovação como se ela fosse uma ameaça moral. O verdadeiro risco não está na flexibilidade, na tecnologia ou nos novos modelos contratuais. O risco está na tentativa de resolver problemas complexos com soluções simplistas, seja por meio de portarias mal calibradas, seja por meio de IRRs que sacrificam a realidade em nome da uniformidade.

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Para empresas, o aprendizado foi claro. Não basta cumprir a lei; é preciso antecipar a interpretação, estruturar contratos com inteligência, investir em governança trabalhista e entender que segurança jurídica hoje não vem apenas do texto normativo, mas da coerência entre modelo de negócio, prática operacional e narrativa jurídica. Em 2025, quem entendeu isso saiu na frente.

O futuro do trabalho no Brasil não será decidido por nostalgia regulatória nem por slogans protecionistas. Ele será definido pela capacidade — ou incapacidade — das instituições de reconhecer que livre iniciativa, quando bem regulada, não é o problema. É parte essencial da solução.