Reforma tributária e a ameaça que não te contaram

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A reforma tributária tem sido amplamente discutida no cenário político, jurídico e econômico do Brasil. É unânime que precisamos de simplificação e transparência no nosso sistema tributário, a busca por um sistema tributário mais eficiente e justo é uma necessidade imperativa para o desenvolvimento do país.

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Atualmente as indústrias sofrem com a alta carga tributária, dificuldade de creditamento dos insumos e compensação de créditos. Até mesmo com relação aos critérios para classificação de insumos eles são totalmente diferentes quando se trata de IPI, ICMS, PIS e COFINS.

Isso acaba ocasionando uma cumulatividade dos tributos, além de muitos erros na escrituração fiscal, inclusive, estudos publicados pelo Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT), demonstram que 95% das empresas cometem erros em sua escrituração fiscal.[1]

A promessa é grande para o setor da indústria, mas, como sempre, o perigo mora nos detalhes, existem questões preocupantes que merecem uma reflexão mais aprofundada, principalmente em relação à possibilidade de vinculação do crédito ao efetivo pagamento, esse perigo não foi observado pela indústria e comércio, que acreditam firmemente na redução tributária para seu setor.

O artigo 156-A, parágrafo 5º, inciso II, da PEC, dispõe:

“Lei complementar disporá sobre:

II- o regime de compensação, podendo estabelecer hipóteses em que o aproveitamento do crédito ficará condicionado a verificação do efetivo recolhimento do imposto incidente sobre a operação, desde que:

O adquirente possa efetuar o recolhimento do imposto incidente nas suas aquisições de bens ou serviços; ou
O recolhimento do imposto ocorra na liquidação financeira da operação (..)”

Um dos principais pontos em foco na atual discussão é a questão da não cumulatividade ampla e o crédito financeiro. Sua implementação poderia trazer avanços significativos, especialmente com vista à atração de investimentos, pois a não cumulatividade plena garante que os créditos tributários eliminem o efeito cascata dos tributos na cadeia produtiva.

No entanto, a previsão do artigo 156-A, pode comprometer e deturpar todo sistema. Nesta toada, surge o questionamento: como garantir uma não cumulatividade plena se existe a há possibilidade de vinculação do crédito ao efetivo pagamento pelo fornecedor?

Esse é uma grande ameaça a reforma tributária e pode comprometer toda a promessa de simplificação e de desoneração do consumo. Em primeiro lugar isso aumentaria os litígios; em segundo lugar acrescentaria mais complexidade e atraso no creditamento, pois haveria a necessidade de confirmação prévia do pagamento do tributo na etapa anterior; em terceiro passou a atribuir ao contribuinte o papel de fiscal e por último, irá comprometer o fluxo de caixa das empresas, o que poderá impactar a realização de negócios.

Dessa forma, é necessário que no Senado sejam feitos refinamentos no texto da reforma tributária para dar maior segurança jurídica, trazendo uma definição mais precisa sobre estes aspectos que garantam, de fato, a implementação da chamada ‘não cumulatividade plena’.

Assim, esse é um grande ponto de atenção, pois ele desrespeita o fato de que a compensação de débitos e créditos só será possível após comprovação do pagamento do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), o que pode gerar problemas para todos os adquirentes, incluindo indústrias e comércio.

O discurso apaixonado e a promessa de desoneração do setor industrial chegam a ser pueris, a ideia não deve ser reinventar a roda, afinal o IVA é utilizado em 90% dos países do mundo, mas esqueceram de contar que em NENHUM desses países o crédito é vinculado ao efetivo pagamento, criação nacional.

Claro que a simplificação e a transparência do sistema tributário são unanimemente desejadas e necessárias, bem assim a atração de investimentos, geração de emprego e o estímulo ao crescimento da economia são fundamentais para o desenvolvimento econômico do Brasil. No entanto, a reforma tributária deve ser cuidadosamente planejada e baseada em profundos e seguros estudos, inclusive se conhecer a alíquota do novo tributo, bem assim evitar problemas como a vinculação do crédito ao efetivo pagamento, o que poderia comprometer todo o propósito de um verdadeiro sistema do Imposto sobre o Valor Agregado (IVA) e seus benefícios.

A não cumulatividade plena e o direito ao crédito financeiro são indispensáveis para o funcionamento de um sistema tributário eficiente e simples para o bom funcionamento do IVA, mas, ela não pode ser condicionada ao pagamento.

É crucial que senadores, deputados e empresários compreendam os desafios e todos os impactos envolvidos na reforma tributária. A não cumulatividade plena e o direito ao crédito financeiro são essenciais para um sistema tributário que efetivamente desonere o consumo. Transferir ao contribuinte o papel de fiscalização não parece razoável. Devemos debater e aprimorar o texto da reforma agora, pois adiar essa tarefa pode resultar em litigiosidade e insegurança jurídica no futuro, uma vez que a esperança de correções na lei complementar pode ser frustrada pelas amarras constitucionais.

É hora de agir com responsabilidade, bom senso e visão de futuro para construir um sistema tributário que beneficie à economia e a todos os brasileiros.

Caso os detalhes fiquem para depois, esse depois será resolvido no STF e teremos ainda mais litigiosidade e insegurança jurídica, o que contraria a promessa da reforma tributária e o desejo de todos.

Este artigo é parte integrante da série “A reforma tributária por elas”. A série, sob a coordenação de Luiza Leite, faz parte do projeto “Mulheres no Tributário”

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[1] https://ibpt.com.br/brasil-tem-alta-carga-tributaria-mas-continua-oferecendo-menor-retorno-a-populacao/