Cerca de 55 mil pessoas estão inscritas para participar da COP30, que começa em uma semana (10/11) em Belém (PA), e vai receber 143 delegações internacionais. Será o terceiro maior número de participantes da conferência do clima, atrás apenas de Dubai, que recebeu 85 mil pessoas em 2023, e Baku, que recebeu 65 mil em 2024.
Para alguns pesquisadores, esses números são grandes demais. O tamanho que a COP atingiu nos últimos anos passou a ser um fator negativo para atingir o objetivo de barrar o aquecimento global, dizem, e tornar a conferência menor poderia ajudar a torná-la mais efetiva.
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Benito Muller, pesquisador da Instituto de Mudança Ambiental da Universidade de Oxford, afirmou que “as conferências do clima cresceram de forma orgânica, sem qualquer direção. Algumas pessoas poderiam até dizer que é como um câncer, fora de controle”. A frase foi dita em entrevista à revista científica Undark Magazine no ano passado.
As primeiras conferências, em Berlim e Genebra, em 1995 e 1996, tiveram menos de 5 mil participantes. O número deu um salto para 10 mil pessoas em Kyoto, em 1997, que resultou na assinatura do Protocolo de Kyoto. A média de participantes seguiu em um patamar acima dos 10 mil de forma constante entre a COP11 em Montreal, em 2005, e a COP20, em Lima, em 2014. Em 2009, na COP15, na Dinamarca, houve um pico de 40 mil pessoas. Depois de Paris, em 2015, quando novamente 40 mil participaram do evento, o número nunca caiu para menos de 20 mil.

Muller é autor de um estudo de 2021 que propõe uma reforma drástica na forma como as conferências são conduzidas. De acordo com o trabalho, o crescimento descontrolado da COP diluiu o foco e implementou uma série de funções que não são essenciais ao objetivo central da conferência.
O estudo afirma que o tamanho gigantesco atingido pela conferência complica a organização, aumenta os custos para os países-sede e cria uma pressão para que cada encontro tenha um resultado digno de cobertura midiática para justificar os gastos. Segundo Muller, essa pressão é inapropriada para as decisões mais técnicas e rotineiras que seriam necessárias na fase de implementação do Acordo de Paris.
As dificuldades logísticas enfrentadas pelo Brasil para receber a conferência em Belém parecem corroborar essa visão. A própria ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, disse ao JOTA em agosto que as questões logísticas tiram força do “debate de substância” do evento.
E as barreiras logísticas para participar da COP30 vão atingir principalmente os países mais pobres, com recursos financeiros limitados, destacou Jennifer Bansard, do Instituto Internacional para o Desenvolvimento Sustentável (IISD).
“Se você é um representante de um Estado insular em desenvolvimento e precisa pegar cinco ou seis voos para chegar em Belém, isso aumenta o custo”, disse ela em uma publicação do IISD na semana passada.
Países pequenos, como os membros da Aliança dos Pequenos Estados Insulares (Aosis, na sigla em inglês), há anos reclamam que a rotação do países-sede dificulta que países pequenos presidam a conferência e que falta tempo para que as partes façam as discussões.
Para Marcio Astrini, secretário executivo do Observatório do Clima, o crescimento da COP é inevitável com as mudanças climáticas atingindo cada vez mais a vida das pessoas.
“Nós temos muitos desses setores que não olhavam para a agenda climática, ou olhavam de forma muito distante, e que hoje querem participar”, afirma Astrini. “Então é inevitável que você tenha cada vez mais gente da sociedade civil, do setor empresarial e também de dentro dos governos, interessada nas conferências.”
“Porque a mudança climática está aumentando o preço do café, está impactando pessoas ao redor do mundo, com as cheias no Paquistão, com as secas na Somália, com o recorde de temperatura e enchente no Rio Grande do Sul”, diz Astrini.
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No entanto, para a cientista política Luciana Veiga, especialista em comportamento político, a frequência anual da conferência deveria ser positiva para manter o engajamento contínuo, mas o tamanho e a falta de foco fazem com que essa vantagem se perca.
“Você cria metas que nem tem tanto tempo para implementar. Quem está diretamente envolvido já começa a se preparar para outra conferência, inclusive com uma produção que esses eventos demandam”, afirma Veiga, que é professora da Universidade Federal do Estado Rio de Janeiro e da Fundação Getúlio Vargas. “Então a conferência acaba esvaziada para a opinião pública, gerando uma visão de que ela não é efetiva, não entrega resultados.”
Veiga afirma que os problemas logísticos da COP30, em Belém, inclusive, diluíram os efeitos positivos de termos a conferência no Brasil — em vez de em países com economia focada no petróleo, como nos últimos anos.
“O impacto de a COP30 ser no Brasil foi menor do que a gente esperava porque a questão da falta de alojamento, de como vai ficar a infraestrutura, acabou dominando a pauta, inclusive do jornalismo”, afirma Veiga. “Tanto nacionalmente como internacionalmente a agenda ficou por conta da questão logística e de forma predominantemente negativa.”
Para que serve a COP30?
O principal objetivo das conferências, até 2015, era a negociação de um acordo para cortar as emissões e evitar o aumento de temperatura média do planeta.
No estudo “Quo Vadis Cop”, assinado por Muller em conjunto com os pesquisadores Jen Allan, Matthias Roesti e Luis Gomez-Echeverri, os pesquisadores argumentam que, a partir da assinatura do Acordo de Paris, o objetivo deveria ser a implementação e fiscalização do combinado, mas o crescimento das COPs dilui esse foco.
E, para Muller, a “fanfarra” em torno da conferência poderia gerar uma “fatiga climática”.
No entanto, nos últimos anos, a COP conseguiu avanços significativos além da implementação do Acordo de Paris. Os principais são as iniciativas de financiamento, como o “novo objetivo coletivo quantificado” (NCQG), nova meta de arrecadação de recursos para apoiar as ações de mitigação e combate ao aquecimento global; e o Fundo de Perdas e Danos, acordado em 2022, que prevê assistência financeira dos países mais ricos às nações mais impactadas pelos efeitos do clima. O fundo era uma antiga demanda dos países que estão sofrendo as consequências mais severas de eventos climáticos extremos como inundações, secas e incêndios.
Os fundos são a principal aposta do Brasil para a COP deste ano, especialmente o Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF, na sigla em inglês) e o projeto de Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação (REDD+) — No mês passado, o presidente Lula anunciou o aporte de U$ 1 bilhão (R$ 5,4 bilhões) ao TFFF como uma tentativa de catalisar investimentos internacionais públicos e privados.
Muller propõe em sua pesquisa, no entanto, que as outras funções cumpridas pela conferência da ONU sejam remanejadas para outros eventos, permitindo uma mudança do modelo da COP para algo mais enxuto e fixo em um só local, com menos de 5 mil participantes e sede em Bonn, na Alemanha, onde fica a sede da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (UNFCCC, na silga em inglês), que organiza a COP.
Nesse modelo, a COP lidaria com os aspectos técnicos da implementação do acordo de Paris e a parte mais política e midiática do evento seria transferida para outros eventos, as Semanas de Ação Climática, que poderiam acontecer com outro tipo de regularidade.
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“O modelo proposto tem uma série de vantagens, como permitir que todas as partes presidam a COP, bem como diminuir a pressão para resultados midiáticos em todo evento”, diz o estudo. “Mas a vantagem mais importante é a diminuição dos custos.”
No entanto, para Márcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima, não é a frequência ou o tamanho das conferências que faz com que estejamos tão longe dos objetivos do Acordo de Paris.
“Mesmo porque as conferências de clima acontecem durante duas semanas. As outras 50 semanas do ano são quando os acordos precisam ser implementados, e não são”, diz ele.
Para Astrini, mudanças de fato são necessárias, mas a grande participação é essencial ao processo.
“Precisamos de mais rapidez, precisamos de mais pressão, precisamos de mais ação, precisamos de respostas melhores, mais eficientes e mais rápidas. O mecanismo não é perfeito”, afirma.
“Mas a participação tem que acontecer. É isso que vai fazer com que, inclusive, exista a pressão sobre esses tomadores de decisão e que a agenda de clima seja cada vez mais absorvida por setores que não sejam a diplomacia ou a área de meio ambiente.”
Formas de tornar o processo mais eficiente foram bastante discutidas na Conferência de Mudança Climática em Bonn, em junho, e essas conversas devem continuar na próxima semana em Belém. No entanto, observadores são céticos quanto à possibilidade de grandes mudanças no formato.
“Uma questão importante é encontrar um equilíbrio entre tornar o processo gerenciável e garantir uma participação equilibrada, especialmente entre países desenvolvidos e em desenvolvimento”, afirmou Bansard em sua análise para o IISD. “Por exemplo, como limitar o número de participantes — isso se aplica a representantes governamentais, observadores ou diferentes categorias de partes interessadas?”