Background check: verificação de antecedentes em contratos de trabalho e a LGPD

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Atualmente, não há no Brasil lei específica sobre verificação de antecedentes para empregados e candidatos a emprego. A jurisprudência e os princípios gerais de Direito normalmente servem de orientação para os empregadores, encontrando o desafio de garantir a proteção do patrimônio e das atividades da empresa, sem ofender direitos fundamentais dos trabalhadores como a intimidade, privacidade e não discriminação.

O artigo 508 da CLT permitia a rescisão do contrato de trabalho do bancário por justa causa no caso de falta contumaz no pagamento de dívidas legalmente exigíveis, o que permitia a interpretação de que o empregador poderia verificar antecedentes creditícios de bancários. A previsão legal foi revogada em 2010, porém.

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Há casos específicos em que a lei autoriza a checagem de antecedentes criminais, a depender da natureza da atividade, como é o caso dos vigilantes (artigo 16, VI da Lei 7.102/83). Em alteração recente pela Lei 14.811/2024, o Estatuto da Criança e do Adolescente passou a prever que os estabelecimentos educacionais que desenvolvam atividades com crianças e adolescentes devem manter certidões de antecedentes criminais atualizadas de todos os seus colaboradores.

Quando não há autorização expressa em lei, o tema é, atualmente, analisado pela Justiça do Trabalho tendo como base o Tema Repetitivo 1 fixado pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST). Segundo a corte, a exigência de certidões de antecedentes criminais em casos em que não há previsão legal expressa autorizando-a depende de a empresa conseguir provar que a checagem é substancialmente importante para o cargo ao qual o trabalhador está se candidatando ou para o cargo ocupado pelo empregado.

Por exemplo, em decisão de fevereiro de 2024, o TST condenou empresa do ramo alimentício que exigia certidão de antecedentes criminais de todos os empregados de maneira indiscriminada, incluindo o reclamante, que foi contratado como auxiliar de produção. Diante do não enquadramento da função do reclamante em nenhuma das funções em que a lei ou o Tema do TST autorizem a exigência dos antecedentes criminais, a empresa foi condenada ao pagamento de indenização por danos morais.

De outro lado, em decisão recente, o TST julgou improcedente pedido de indenização por danos morais, julgando como legítima a verificação de antecedentes criminais no caso de empregado que tinha acesso a dados bancários de clientes da reclamada, por se tratar de informações sigilosas (TST-AgAIRR-11197-10.2020.5.15.0130, 2ª Turma).

A exigência de antecedentes cíveis, creditícios ou outros, por sua vez, tende a ser considerada ilegal pela jurisprudência, já que tais antecedentes não guardam nenhuma relação com o exercício da função e do contrato de trabalho.

A verificação de antecedentes de forma ilegal ou abusiva gera para a empresa riscos de ações individuais, pleiteando indenização por danos morais, e ação cível pública, usualmente ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) que, além do pagamento de indenização, costuma pleitear que seja determinada judicialmente a obrigação da empresa rever sua política interna para não mais proceder à verificação de antecedentes na forma praticada.

Por outro lado, a verificação de referências de trabalhos anteriores é aceita pela Justiça do Trabalho e é bastante comum entre os empregadores. Para evitar riscos, ela deve se concentrar em informações objetivas, como cargos, datas de contratação e rescisão, desempenho em geral e habilidades profissionais. Deve-se evitar perguntas sobre motivos de demissão, aparência ou preferências políticas e sexuais.

Nos casos em que é lícito obter a checagem de antecedentes, é recomendável que o empregado ou candidato a emprego forneça a certidão de antecedentes criminais, demonstrando sua ciência e concordância com tal exigência, pois isso tem sido considerado importante pela Justiça do Trabalho para garantir a transparência e informação do empregado no processo.

Sob a ótica da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) ainda, o empregador deve buscar “base legal” adequada para justificar o tratamento dos dados relativos à checagem de antecedentes, não sendo recomendável que o “consentimento do titular dos dados” seja utilizado pela empresa para tanto.

No contexto da relação trabalhista, em que há presumida hipossuficiência do empregado ou candidato ao emprego, o consentimento obtido pelo empregador pode ser considerado uma base legal frágil por não cumprir com a condição obrigatória do consentimento, que é ser dado de forma livre.

Além disso, o consentimento previsto na LGPD pode ser negado e revogado a qualquer tempo, o que pode prejudicar o atingimento da finalidade pretendida no contexto da relação de trabalho, especialmente para fins de verificação de antecedentes. Portanto, a checagem de antecedentes deve ser amparada em outra base legal prevista pela LGPD, como por exemplo, e mais comumente, no “cumprimento de obrigação legal”, quando possível, ou no “legítimo interesse”.

O legítimo interesse poderá fundamentar o tratamento de dados pessoais para finalidades específicas que visem o apoio e promoção de atividades do empregador ou a proteção, em relação ao titular, do exercício regular de seus direitos ou prestação de serviços que o beneficiem.

Quando o tratamento for baseado nisso, somente os dados pessoais estritamente necessários para a finalidade pretendida poderão ser tratados, sempre no limite do razoável para cada cargo, sem qualquer finalidade ou uso paralelo, sem que haja conflito com direitos fundamentais do titular de dados, e considerando sempre suas expectativas legítimas. Além disso, a base legal do legítimo interesse não é aplicável ao tratamento de dados pessoais sensíveis.

Alternativamente, a LGPD prevê, ainda, que o consentimento pode ser dispensado para o tratamento de dados pessoais tornados manifestamente públicos pelo titular dos dados, resguardados os direitos do titular e os princípios previstos na lei.

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Portanto, tratamento de dados disponibilizados pelo empregado ou candidato a emprego em perfis de livre acesso em redes sociais é, a rigor, permitido, desde que respeitada a finalidade, a boa-fé e o interesse público que motivaram a disponibilização dos dados pessoais pelo titular, bem como sua legítima expectativa sobre como os dados serão utilizados.

Nesse cenário, para além dos riscos de ações individuais e ação cível pública na esfera trabalhista, a checagem de antecedentes sem os devidos cuidados ou em descumprimento à legislação pode acarretar também as penalidades previstas na LGPD, incluindo a suspensão das atividades de tratamento e multas de até R$ 50 milhões por infração.

Portanto, os impactos jurídicos da checagem de antecedentes de empregados e candidatos a empregos, bem como os seus limites e restrições, requerem uma análise multidisciplinar do tema. Se a verificação de antecedentes for considerada abusiva no âmbito da legislação ou jurisprudência trabalhista, também poderá implicar em descumprimento da LGPD, por estar em conflito com os direitos e com as legítimas expectativas do titular.