Em meio à grita geral no Congresso contra a agenda tributária do governo Lula, um detalhe não divulgado pelo Executivo pode tumultuar ainda mais as negociações com os parlamentares: a tributação de 5% dos produtos financeiros atualmente isentos (como LCI, LCA e debêntures, entre outros) deve colocá-los no raio de alcance do imposto mínimo de 10% sobre os ricos previsto no PL 1087/25, que isenta de IR quem recebe até R$ 5 mil.
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É claro que isso depende de as duas medidas serem aprovadas nos termos propostos pelo governo, o que é um grande “se”, especialmente no caso da MP 1303, que tem grande chance de ser desidratada ou mesmo caducar. Ainda assim, evidencia o modus operandi da formulação de política econômica, que tem sido fonte de recorrentes atritos com parlamentares e o setor privado.
Governo já tinha intenção de colocar isentos no imposto mínimo
O governo tinha intenção desde o início de incluir os investimentos isentos dentro do imposto mínimo de 10%. Não o fez temendo as repercussões negativas de bancadas como a ruralista e dentro do próprio governo, já que isso afeta também o apetite de investidores para comprar papéis que lastreiam projetos de infraestrutura.
Dentro da estratégia de recuo no decreto do IOF e da discussão mais ampla sobre redução de gastos tributários, a Fazenda trouxe à luz o tema da isenção de alguns produtos financeiros, promovendo a taxação de 5%. Mas não deixou explícito que, na prática, essa cobrança de IR pode ser maior do que isso, ainda que ao longo do tempo, uma vez que ambas as medidas só entrarão em vigor em 2026, se aprovadas.
O fato ocorre porque o PL 1087/25 prevê que não entrarão no cálculo do eventual adicional “os rendimentos de títulos e valores mobiliários isentos ou sujeitos à alíquota zero”. Os ativos tributados, assim, devem ser incluídos na conta do imposto a pagar.
Procurado pelo JOTA, o Ministério da Fazenda não havia se manifestado sobre a questão até o fechamento deste texto.
O que dizem os tributaristas
Ex-diretor de programa da Secretaria Especial de Reforma Tributária e sócio do escritório Loria Advogados, o advogado Daniel Loria concorda com a leitura de que a MP acaba colocando os títulos atualmente isentos no alcance do imposto mínimo. “Isso vale para novas emissões a partir de 2026. Então, o impacto arrecadatório seria diluído no tempo. Parece que o governo está fazendo isso para melhorar estruturalmente a tributação do mercado financeiro e não para arrecadar no curto prazo”, argumentou.
Felipe Salomon, sócio do escritório Levy & Salomão Advogados, avalia que o fim da isenção para esses produtos está tendo um duplo impacto. “Deixando de ser isentos, esses rendimentos devem compor a base de cálculo do imposto mínimo [IRPFM]. A consequência será a de aumento do valor devido a título de IRPFM. Isso porque, sendo o imposto mínimo de 10%, e estando o contribuinte obrigado a incluir um rendimento tributado a 5% na base de cálculo, a diferença entre essas alíquotas será capturada pelo IRPFM”, explicou o advogado.
Incerteza política
Responsável por relatar o projeto de reforma do Imposto de Renda, o deputado Arthur Lira ainda não deixou claro como irá tratar do tema do imposto mínimo. Ainda que tenha sinalizado que pode elevar o início da faixa de incidência, reduzindo seu impacto fiscal, ele não se comprometeu publicamente ainda com nada, apesar da promessa de entregar seu relatório no fim deste mês.
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Com as novas regras para produtos financeiros isentos, a longo prazo o efeito arrecadatório do imposto tende a ser maior, dado que eventual adicional de IR alcançará um universo mais amplo de rendimentos.
E isso é uma variável a ser considerada nas definições que o parlamentar terá que tomar para apresentar seu texto ao colegiado da comissão especial e depois ao plenário da Câmara, em um ambiente já conflagrado entre Executivo e Congresso. O próprio governo avalia que essa questão dos isentos, a partir das mudanças na MP 1303, será um dos temas na discussão do PL da reforma da renda. A dúvida é em que termos.