O Superior Tribunal de Justiça (STJ) proferiu, recentemente, decisão no julgamento do REsp 1.948.478, pela qual uma empresa não pôde deduzir valores pagos a diretores a título de Participação nos Lucros e Resultados (PLR) e gratificações da base de cálculo do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL).
O relator do acórdão, ministro Gurgel de Faria, afirmou em seu voto que a PLR deve ser adicionada ao lucro líquido para estabelecer o lucro real, base do IRPJ e da CSLL, pois diretores normalmente detêm autonomia em suas funções, o que os classificaria como administradores independentemente se contratados como empregados ou diretores estatutários.
O cenário, contudo, está longe de ser pacífico.
A Receita Federal, em geral, defende que a PLR paga a membros da diretoria, independentemente se mantida a relação de emprego, não é dedutível da base de cálculo do IRPJ, em função da vedação à dedutibilidade de gratificações ou participações pagas a administradores, prevista na Lei 4.506/1964, no Decreto-Lei 1.598/1977 e no próprio RIR/2018.
Porém, a Receita autoriza a dedutibilidade desses valores para fins de CSLL, tendo em vista o item 163 do Anexo I da IN 1.700/2017, e, ainda, que “(i) a referida contribuição possui base de cálculo própria, nos termos do art. 57 da Lei 8.981/1995, e (ii) não há dispositivos na legislação tributária que determinem a adição do valor pago a título de participações nos lucros aos administradores para fins de apuração do resultado ajustado”. Esse é o entendimento manifestado na Solução de Consulta 16/2018.
O STJ, portanto, adotou posicionamento mais restritivo do que a própria RFB. A ministra Regina Helena Costa, relatora originária do caso, proferiu voto favorável ao contribuinte. Prevaleceu, contudo, o voto divergente do ministro Gurgel de Faria, para quem “a lei não faz distinção entre dirigentes ou administradores contratados sob o regime celetista e dirigentes ou administradores contratados sob o regime estatutário, não cabendo ao Poder Judiciário se imiscuir na competência do Poder Legislativo, devendo se ter deferência pela escolha legislativa” de indedutibilidade dos valores de PLR.
No âmbito administrativo, a jurisprudência do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), que historicamente foi oscilante, demonstrou recentemente uma tendência favorável aos contribuintes no âmbito da Câmara Superior (como por exemplo, os acórdãos 9202-009.801 de 2021 e 9101-006.372 de 2022) antes do julgamento recente do tema pelo STJ. Contudo, diante do julgado do STJ, não é possível afirmar que a tendência favorável será mantida nas cortes administrativas.
Este contexto se mostra bastante difícil para as empresas que, apesar de terem bons argumentos pela dedução dos valores e precedentes administrativos favoráveis, deverão agora considerar uma decisão contrária do STJ, que pode ser a chave para uma nova virada no cenário jurisprudencial.
O desafio das empresas de harmonizar suas práticas internas a partir dos entendimentos do Poder Judiciário e da RFB aumenta ainda mais quando incluímos o entendimento da Justiça do Trabalho sobre a natureza jurídica dos pagamentos feitos a diretores empregados a título de PLR.
Em 2003, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) editou a súmula 269 para prever que o contrato de trabalho de um empregado eleito para a diretoria de determinada empresa deve ser suspenso, não se computando o tempo de serviço desse período, salvo se houver subordinação jurídica. Na contramão da decisão recente do STJ, a súmula do TST sugere que a existência de subordinação jurídica possui influência sobre o reconhecimento do tempo de serviço do diretor empregado, o que tem impacto direto nas verbas trabalhistas que esse profissional pode e/ou deve receber.
A Lei 10.101/2000, conhecida como Lei da PLR, regulamenta o pagamento de valores a título de PLR e estabelece que a verba não substitui a remuneração devida aos empregados nem constitui base de incidência de reflexos trabalhistas e contribuições previdenciárias, permitindo ainda que a PLR paga a todos os empregados seja deduzida como despesa operacional para a apuração do lucro real da pessoa jurídica.
A legislação não faz qualquer distinção entre quais empregados podem ou não receber a PLR, nem ainda veda a dedução da PLR como despesa operacional a depender de qual indivíduo é beneficiado pela verba, desde que o profissional possua a condição de empregado.
Diferenciar diretores estatutários de diretores empregados a partir dessa ótica é crucial para compreender suas funções e responsabilidades. Diretores estatutários possuem amplos poderes de administração e decisão, definidos pela Lei das S.A. (Lei 6.404/1976), sendo responsáveis pela gestão estratégica e operacional da empresa e podendo assinar contratos e tomar decisões em nome da companhia. Já os diretores empregados, apesar de ocuparem cargos gerenciais, têm seus poderes de administração limitados pelo contrato de trabalho e normas internas da empresa e, por decorrência lógica da lei, estão subordinados a representantes da própria empresa, como acionistas, conselhos etc.
Para as empresas, a impossibilidade de deduzir os valores de PLR e gratificações pagos a diretores empregados da base de cálculo do IRPJ e da CSLL pode resultar em um aumento significativo na carga tributária. Isso pode levar a uma revisão das políticas de remuneração e bônus para diretores, além de uma reavaliação dos contratos de trabalho e das estruturas de gestão.
Apesar de a decisão do STJ parecer isolada quando comparada ao posicionamento da Justiça do Trabalho e da própria Receita Federal sobre o tema, o posicionamento do STJ pode implicar, a médio e longo prazos, a necessidade de as empresas se adaptarem a novos entendimentos dos Tribunais, de modo a garantir conformidade e otimização de práticas de gestão e tributação.