O futuro do piso salarial nacional do magistério

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O Brasil possui 2,4 milhões de professores de ensino básico. Segundo o Censo Escolar de 2023, quase 2 milhões estão nas redes estaduais e municipais. É a maior carreira pública do país. Além da folha de pagamento, há o impacto social e econômico. Professores são o fator intraescolar mais relevante para a aprendizagem dos alunos. O que o direito público tem a ver com isso? Muito!

As carreiras desses milhões de servidores estão regulamentadas em leis próprias de cada rede de ensino. Há ao menos 5.593 normas jurídicas definindo temas como regime de trabalho, progressão, gratificações e licenças.

A fragmentação se torna ainda mais complexa porque, embora os entes tenham autonomia para editar suas normas, estão sujeitos à lei federal que, por determinação constitucional (CF, art. 206, VIII), cria um piso salarial nacional para o magistério.

A Lei 11.738/2008 estabelece um valor mínimo para o vencimento inicial dos professores da educação básica pública. Anualmente, o governo federal publica portaria reajustando este valor, com impacto na folha de todos os estados e municípios.  A criação do piso foi fundamental para ampliar e sustentar a remuneração dos professores, mas hoje gera distorções que precisam ser enfrentadas.

Quando a lei foi questionada no STF, o principal argumento para a constitucionalidade de um valor determinado por um ente, mas pago por outros, foi a previsão de uma complementação da União às redes incapazes de arcar com o piso. Contudo, estados e municípios não acessam este complemento, seja por falta de regulamentação dos critérios, seja por inexistência de tal previsão no orçamento da União.

Além disso, os mecanismos de atualização do piso estão inadequados à nova legislação que, desde 2020, regulamenta o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb). Muitos municípios acionam a União no Judiciário, alegando que, enquanto não for editada lei com nova forma de reajuste, não estariam obrigados a aplicar as portarias federais. Também afirmam incapacidade fiscal e imprevisibilidade dos percentuais.

Pesquisa realizada pela Sociedade Brasileira de Direito Público revelou que essas demandas encontram respostas diferentes em cada Tribunal Regional Federal e que a maior parte das decisões são liminares de primeira instância. Assim, a despeito de haver um piso nacional, sua aplicação é flexibilizada a critério dos juízes, de maneira provisória e não uniforme. Um cenário de grande insegurança jurídica para gestores públicos e professores.

O Poder Judiciário carece de insumos e ferramentas adequadas para definir um tema tão complexo e estruturante para a educação brasileira. São os gestores públicos, a começar pelo governo federal, que precisam caminhar em novas propostas para o piso do magistério, corrigindo distorções e atualizando os instrumentos jurídicos de valorização da carreira.