O Brasil pode dar um passo importante nos próximos dias ao iniciar o processo de implementação da bula digital. Uma transformação coerente com o atual momento de digitalização no país e no mundo.
Vale destacar que o conceito de acesso às bulas de medicamentos por meios eletrônicos teve seu início há mais de uma década, visto que tal possibilidade foi trazida pela Anvisa na RDC 47/2009 que, em seu art. 4º inciso VI, fornece a definição de “Bulário Eletrônico”, que se encontra em operação desde 2011. Agora, a agência está prestes a aprovar a transição da bula impressa para a digital, iniciando por aqueles medicamentos com baixo risco e os que serão entregues diretamente ao paciente por profissionais de saúde.
Será o início de um processo que irá mudar a vida do cidadão, mas que precisa ser embasado em fatos que mostram os benefícios para a sociedade. Exigir a obrigatoriedade da bula impressa não faz mais sentido em um país onde existem 1,2 celular por pessoa, segundo dados da FGV de 2023.
A digitalização já é realidade na vida de todos, inclusive entre a população mais carente. Vale enfatizar que já existem programas governamentais que promovem o acesso universal pela internet. Um dos exemplos com mais destaque dessa tendência é o Pix. A ferramenta criada pelo Banco Central é um absoluto sucesso e foi absorvida por 161 milhões de brasileiros em 2023.
Outra é a determinação do fim da entrega do Imposto de Renda em papel desde 2010, quando o uso de internet no Brasil era ainda muito incipiente. Atualmente, 100% das declarações são feitas de forma online. Mesmo o Bolsa Família, maior programa de transferência de renda do país, tem todo o cadastro feito de forma digitalizada.
Assim, a chegada da bula digital será uma grande evolução e em linha com as transformações tecnológicas vividas pelo Brasil. Durante a pandemia, a Anvisa corretamente permitiu a isenção de bulas impressas para remédios destinados a uso hospitalar ou de destinação institucional mediante acesso à bula digital. Essa medida certamente ajudou a salvar vidas naquele momento de calamidade, fazendo com que medicamentos chegassem mais rápidos a quem estava precisando.
Com letras pequenas e o uso de termos não muito conhecidos, as bulas impressas são muitas vezes de difícil compreensão pela sociedade. Já as bulas digitais abrem um leque enorme de possibilidades para a população. Nelas, é permitido que se faça uso, por exemplo, de recursos como vídeos, infográficos, áudios, além, é claro, do texto tradicional. Outra vantagem é que as bulas digitais podem ser atualizadas em tempo real a cada novo estudo e autorização da Anvisa.
Através de um QR Code, os indivíduos apontarão as câmeras dos seus smartphones e terão acesso a todas as informações necessárias e adequadas. Em resumo, as bulas digitais melhoram o acesso à informação de qualidade e o letramento em saúde da população. O resultado da implementação das bulas digitais com informação mais clara e de mais fácil compreensão será a ampliação do acesso às informações dos medicamentos.
Além disso, as bulas digitais promovem uma maior inclusão social, proporcionando recursos de acessibilidade para pessoas com deficiência visual ou auditiva. Com a possibilidade de textos em áudio, aumento do tamanho das letras e vídeos gravados em Libras, a informação se torna mais democrática.
A decisão de adotar bulas digitais não é meramente uma questão técnica, é uma questão de evolução e progresso. É uma notícia confortante saber que a Anvisa se debruçará sobre o assunto. Mostra a sensibilidade e coragem da agência e da sua diretoria colegiada em colocar em pauta um tema tão importante para a saúde brasileira. Esperamos que, entre o passado e o futuro, a agência decida pelo futuro.