Impactos da reforma tributária no Simples Nacional

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O Simples Nacional é de suma importância para a economia brasileira, sendo a porta de entrada para o empreendedorismo nacional, sendo inegável sua relevância. Com mais de 20 milhões de micro e pequenas empresas, representa 92% dos empreendimentos no país. Segundo o Sebrae, sem a presença do regime simplificado, 64% desses negócios correriam o risco de se tornarem informais, diminuiriam suas atividades ou poderiam até mesmo ser encerrados.[1]

As empresas do Simples Nacional foram responsáveis por 60% dos novos empregos nos dois primeiros meses de 2024, segundo dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged)[2].

Um dado relevante, que refuta a alegação de que o regime simplificado resulta em renúncia fiscal, é que os tributos pagos pelas empresas do Simples Nacional representam 8,2% da receita bruta total. Em contrapartida, os tributos pagos pelas empresas do lucro real constituem 6,99%, conforme informações de 2018 da Receita Federal.

Posto os dados que demonstram a notória relevância do Simples para o crescimento e desenvolvimento do nosso país, vale destacar que o tratamento diferenciado e favorecido destinado as micro e pequenas empresas é assegurado pela Constituição Federal de 1988 (art. 179), sendo imperativa a observância dessa garantia pelos entes federados.

Vale destacar que o tratamento diferenciado de simplificação tem o objetivo de incentivar a formalização das pequenas e micro empresas, não só com a redução tributária como também reduzindo suas obrigações administrativas, tributárias, previdenciárias e creditícias através da lei, trazendo redução no custo da conformidade como um todo.

O primeiro regime tributário favorecido foi criado pela Lei 9.317/1996, dando origem ao Simples Federal, que permitia o pagamento unificado dos tributos federais – IRPJ, CSLL, PIS/Pasep, Cofins, IPI e CPP.

Posteriormente, a Lei Complementar 123/2006 revogou a Lei 9.317/1996 e estabeleceu o Regime Especial Unificado de Arrecadação de Tributos e Contribuições devidos pelas Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Simples Nacional). Com o tempo, o regime simplificado se expandiu para a unificação incluir o ICMS e ISS, além dos tributos federais.

Atualmente, empresas com receita bruta anual de até R$ 4,8 milhões tem a opção de aderir ao Simples Nacional. Este sistema se consolidou como um instrumento essencial para a formalização e incentivo aos micro e pequenos empresários.

A Emenda Constitucional 132, de 21 de dezembro de 2023, realizou uma ampla reforma da tributação do consumo. Entre as mudanças mais notáveis, destaca-se a introdução de dois tributos sobre valor agregado: o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), que substituirão o ICMS e ISS; e a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), que substituirão o PIS/Pasep e Cofins.

Embora a EC 132/2023 tenha preservado o tratamento diferenciado e favorecido para a micro e pequena empresa (art. 146, III, d, CF), é alarmante o possível impacto que a alteração constitucional pode provocar no Simples Nacional.

A implementação do IBS e da CBS resultará em um sistema híbrido para as empresas optantes pelo regime simplificado, sendo duas opções:

permanecer integralmente no regime único, recolhendo os novos tributos dentro do regime simplificado de arrecadação, não sendo permitido créditos nas aquisições e repassando os créditos dos valores efetivamente recolhidos aos adquirentes ; ou
optar pela exclusão do IBS e da CBS do regime simplificado, passando para o regime não cumulativo com a aplicação da alíquota integral, mantendo-se no regime unificado apenas para os demais tributos (IRPJ, CSLL e CPP).

Na primeira situação, se o contribuinte estiver situado no meio da cadeia produtiva, ele pode enfrentar perda de competitividade, pois irá repassar um crédito significativamente menor comparado a uma empresa que não optou pelo Simples Nacional.

No segundo cenário, ele terá que suportar um aumento na carga tributária e aumento do custo da conformidade, pois passará a recolher os novos tributos como se fosse uma grande empresa, além de arcar com o custo de cumprimento de obrigações acessórias de ambos os regimes tributários.

As recentes alterações impactam diretamente as atuais regras de transferência de créditos das empresas do Simples Nacional, estabelecendo um limite equivalente ao valor cobrado no regime único.

Tal restrição representa um retrocesso, atualmente, a transferência integral do crédito de PIS e Cofins é permitida, e essa nova limitação pode prejudicar a competitividade das micro e pequenas empresas. Levando em conta que a alíquota de referência do IBS e da CBS está prevista para ser de 26,5%, qualquer empresa que não consiga transferir esse percentual pode acabar inviabilizando o seu  negócio.

Por essa razão, foi inserido no PLP 58/2024, que trata dos regimes específicos e decorre do grupo técnico formado pela coalização das frentes parlamentares do Congresso Nacional, dispositivo que possibilita a transferência de crédito da CBS, aplicando a mesma alíquota pertinente àqueles que não optaram pelo Simples Nacional. Dessa forma, pretende-se manter as diretrizes atuais relacionadas às contribuições substituídas, PIS e Cofins.

Já o PLP 68/2024, de autoria do Executivo, além de restringir a transferência do crédito do IBS e da CBS ao montante equivalente ao devido por meio do regime único, ainda limita ao tributo valor efetivamente pago na aquisição de bens e serviços de optantes pelo Simples Nacional.

Espera-se que o Congresso Nacional analise com a devida cautela o impacto da reformulação da tributação sobre o consumo para as micro e pequenas empresas do Simples Nacional, que são pilares da nossa economia. É fundamental que a proposta aprovada considere as regras atuais, garanta a competitividade dessas empresas, a fim de promover o empreendedorismo e a sustentabilidade econômica do país.

[1] Disponível em https://agenciasebrae.com.br/dados/a-importancia-do-simples-nacional/. Acesso em: 9 abr. 2024.

[2] Disponível em https://agenciasebrae.com.br/dados/pequenos-negocios-foram-responsaveis-por-60-das-vagas-de-emprego-em-fevereiro/. Acesso em: 9 abr. 2024.