Empresário e empresas de Cambará do Sul são condenados por dano ambiental em APP próxima ao cânion Malacara (12/07/2024)

  • Categoria do post:TRF4

A 5ª Vara Federal de Caxias do Sul (RS) condenou um empresário de Cambará do Sul e duas empresas daquela localidade por danos ambientais a área de preservação permanente (APP), localizada às bordas do Parque Nacional da Serra Geral, em zonas próximas aos cânions Malacara e Índios Coroados. Ele deverão pagar indenização no valor de R$ 865 mil. A sentença, publicada em 8/7, é da juíza federal Ana Raquel Pinto de Lima.

O Ministério Público Federal (MPF), com base em inquérito policial, denunciou dois empresários e duas empresas, respectivamente, sob seu comando, narrando que os acusados teriam operado atividade potencialmente poluidora contrariando as normas legais.

Os réus também teriam causado danos ambientais à zona de amortecimento do Parque Nacional da Serra Geral, destruindo cerca de quatro hectares de vegetação nativa, danificando áreas de banhado, mata atlântica, floresta de araucárias, entre outros. Para tanto, teriam lançado mão de queimadas, terraplanagem, aterros, dreno e alteração de cursos d’água, além da construção irregular de pórtico e estacionamento na APP.

Aos empresários também foi imputada a acusação de infração de decisão administrativa, pois teriam continuado exercendo a atividade comercial (cobrança de ingressos e de estacionamento) mesmo após o empreendimento ter sido embargado pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).

A defesa alegou não haver provas da participação dos denunciados nos fatos de dano ambiental, não tendo sido verificada sua presença, e que não teriam sido visualizadas espécies ameaçadas de extinção. Também sustentou que a edificação sempre foi de posse e propriedade de uma das empresas acusadas, e que a demarcação das denominadas zonas de amortecimento estaria prejudicada pela caducidade do plano de manejo, expedido mais de cinco anos após o decreto de criação do Parque.

Preliminarmente, a juíza Ana Raquel Pinto de Lima reconheceu a prescrição da acusação quanto ao suposto crime de fazer funcionar estabelecimento sem licença. Como o réu já tem mais de 70 anos, reduz o prazo prescricional pela metade, tempo já transcorrido quando do ajuizamento  da ação.

A magistrada analisou, inicialmente, os depoimentos de diversas testemunhas. Entre elas, o perito criminal federal, um agente de polícia federal, dois funcionários e prestadores de serviço das empresas denunciadas e quatro analistas ambientais do ICMBio. Foram consideradas como provas da materialidade e de autoria os autos de infração, termos de apreensão, além de documentos como panfletos turísticos, cadernos de anotações de caixa, pulseiras de identificação para acesso e máquinas de cartão de crédito/débito.

A juíza confirmou a exploração comercial e o potencial poluidor das obras no local de entrada do empreendimento (um antigo posto do ICMS localizado às margens da RS-427). “Diante de tais elementos, tenho como comprovado que, ao menos de 10/11/2020 a 03/12/2020, foram realizadas obras de reforma no imóvel em que funcionava o posto fiscal e dado início ao funcionamento de empreendimento (…), ambos potencialmente poluidores, sem licença do órgão ambiental competente” afirmou.

Da acusação de exercício de atividade com infração de decisão administrativa, o empresário foi absolvido, pois ficou demonstrado, pelo conjunto probatório, que seria impossível comprovar ciência do réu quanto ao embargo administrativo.

Já em relação ao crime de dano à Unidade de Conservação, a magistrada concluiu pela culpabilidade dos réus, empresário e empresas. Lima considerou primeiramente, o Laudo de Perícia Criminal Federal, que indicou que que “a área afetada está localizada na Zona de Amortecimento dos Parques Nacionais Aparados da Serra e da Serra Geral, conclui que os danos ambientais constatados consistiram em corte e queima de vegetação nativa, degradação do solo por terraplenagem e demais benfeitorias (obras, cobertura com brita e grama, etc.), drenagem de banhados, redução da biodiversidade (fauna e flora) e alterações estético-paisagísticas, inclusive em áreas de preservação permanente (APPs)”.

Para a juíza, há provas suficientes de que os crimes de dano foram praticados pelo empresário e pela sua empresa, no intuito de implantar o empreendimento turístico dentro da Unidade de Conservação e sua zona de amortecimento. O acusado confirmou em seu interrogatório que pretendia explorar turisticamente a área, entretanto negou as intervenções realizadas na zona de amortecimento, sustentando que teriam sido causadas por terceiros. No entanto, ao contrário destas alegações, conjunto probatório converge para a conclusão de que os réus praticaram os danos, incluindo os fatos de que a área atingida está dentro da fazenda de propriedade dos mesmos, e que no material de divulgação, as atividades previstas para terem início “em breve” (camping e voos panorâmicos) eram compatíveis com as obras verificadas na zona de amortecimento. Por fim, ela observou que interrogatório do empresário e os depoimentos das testemunhas de defesa confirmam que o réu e a empresa já haviam iniciado os trâmites para implantação do empreendimento turístico e que a estrutura da empresa estava sendo empregada neste objetivo.

A magistrada ressaltou que o atraso na publicação do plano de manejo, editado em 2004, quando então foi regulamentada a zona de amortecimento, o decreto de criação do Parque Nacional da Serra Geral não perdeu sua validade no mundo jurídico, “notadamente porque eventual alteração ou extinção da Unidade de Conservação, nos termos do artigo 225, § 1º, II, da Constituição Federal, somente poderia ser realizada mediante lei, o que não ocorreu”.

Desta forma, a ação penal foi julgada parcialmente procedente, resultando na condenação do empresário e das duas empresas pela prática do crime de dano à Unidade de Conservação, resultando em dois anos e 11 meses de reclusão para o indivíduo e multas para as pessoas jurídicas. A pena de reclusão foi substituída por pena alternativa (prestação de serviços à comunidade ou entidade pública), com a mesma duração. Os três condenados deverão pagar indenização ambiental, em favor da União, solidariamente, no valor de R$ 865 mil.

O empresário foi absolvido da acusação de exercício de atividade com infração de decisão administrativa, e o crime de exercer atividade sem autorização legal prescreveu.

Cabe recurso ao Tribunal Regional Federal da 4ªRegião (TRF4).

Secos/JFRS (secos@jfrs.jus.br)

(Foto: Portal Municipal de Turismo de Praia Grande)