A companheira e o filho de um operador de uma empresa de compostagem de Paranaguá tiveram reconhecido o direito à indenização de R$ 147,5 mil cada um por danos morais devido à morte dele no ambiente de trabalho. O trabalhador, que tinha 34 anos de idade, faleceu ao ser exposto a gases tóxicos em um tanque de tratamento de chorume. A empresa negou que o empregado atuava na limpeza de tanques, mas não conseguiu comprovar a alegação.
Os herdeiros receberão ainda uma pensão. O filho receberá o valor até completar 21 anos de idade. Já a companheira terá direito à pensão até a data em que o empregado completaria 76 anos e seis meses, expectativa média de vida de um homem brasileiro, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O valor é de dois terços da remuneração paga à época do acidente, considerando-se a soma do salário e adicional de insalubridade, bem como as demais parcelas de natureza salarial habitualmente pagas: adicional de risco, média de horas extras e de adicional noturno, média de reflexos em DSR, 13º salário e terço de férias.
A decisão é da 3ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (TRT-PR), com relatoria do desembargador Eduardo Milleo Baracat, e confirma o entendimento do julgamento da 1ª Vara do Trabalho de Paranaguá. Ainda cabe recurso.
O trabalhador foi contratado em janeiro de 2013 para atuar como meio oficial. Ao longo do contrato, passou a exercer a função de operador de Estação de Tratamento de Efluentes (Ete). Entre suas atividades estava a limpeza de tanque de tratamento de chorume.
No dia 9 de maio de 2020, o funcionário faleceu dentro de um desses tanques. O laudo do exame de necropsia indicou que a morte decorreu da inalação de substância cáustica, tóxica e nociva. O trabalhador não estava utilizando os Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) indicados no Programa de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA) para exercer essa atividade: luvas, óculos, macacão, respirador purificador de ar, protetor facial, entre outros.
A empresa afirmou que nunca pediu ao empregado que entrasse nos tanques/cilindros de tratamento de efluentes. Destacou que a atividade desenvolvida pelo trabalhador era documentar dados do processo e controlar materiais e produtos utilizados, sem qualquer risco específico. A empresa frisou que a coleta de amostras para análise limitava-se a lançar um balde no interior do tanque, sem necessidade de entrar nesse espaço.
Porém, a testemunha ouvida a convite da parte autora afirmou que o trabalhador estava no tanque “por ordem de serviço”, embora não costumasse realizar esse trabalho com frequência. E a ata notarial do teor de uma conversa por telefone entre trabalhador e seu superior hierárquico confirmam que a empresa sabia que o empregado atuava nos tanques. No diálogo, o empregado informa ao seu gerente das condições precárias de trabalho, que causavam mal-estar físico. Ele fez referência à possibilidade de morrer por esse motivo. A conversa ocorreu cinco dias antes da morte do empregado.
O relator do acórdão, desembargador Eduardo Milleo Baracat, destacou que a conversa entre o trabalhador e seu superior hierárquico indicam que a empresa estava ciente da atividade realizada dentro do tanque, assim como da queixa do empregado quanto ao risco de exposição aos gases provenientes do interior. “No entanto, a única recomendação do superior hierárquico foi para que o trabalhador continuasse a tarefa devagar e com cuidado. Não houve determinação para que a atividade fosse suspensa e os riscos reavaliados, nem orientação para que o obreiro não adentrasse no espaço confinado ou mesmo para que não se aproximasse das substâncias tóxicas que estavam dificultando a conclusão dos trabalhos. É desconcertante constatar que, mesmo tendo sido alertado do risco de morte – o obreiro quase suplica pela sua sobrevivência ao responder que atenderia ao pedido de enviar fotos ao final do turno se ainda estivesse vivo até lá – o interlocutor nada fez para preservar a integridade física do trabalhador. Está-se diante de acidente que poderia ter sido facilmente evitado, caso a reclamada tivesse o mínimo de empatia. Mais do que cumprir normas de saúde e segurança do trabalho, bastava que seus prepostos dessem ouvidos ao clamor do obreiro e agissem para garantir sua segurança e bem-estar”.
Responsabilidade objetiva da empregadora
A 3ª Turma do TRT-PR entendeu pela responsabilidade objetiva da empresa pelo acidente e morte do trabalhador, uma vez que o objeto social do estabelecimento consiste na compostagem, tratamento de resíduos e aterro sanitário, atividades classificadas como sendo de grau de risco 3 conforme Anexo I da NR-04 (CNAE 38.39-4-01), “o que por si só autorizaria a aplicação da responsabilidade objetiva”. Não bastasse isso, continuou o Colegiado, a prova documental constante dos autos revela que a atividade laboral especificamente desenvolvida pelo trabalhador, operador de ETE, também era de risco, notadamente considerando as informações constantes do PCMSO – Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional e do PPRA – Programa de Prevenção de Riscos Ambientais, do Governo Federal, “no sentido de que, além da exposição a agentes de risco físico, químico e biológico, havia o perigo inerente ao labor em espaço confinado. Evidente, portanto, que a atividade laboral e empresarial eram de risco acentuado, razão pela qual agiu com acerto o Juízo de origem ao reconhecer que as controvérsias relativas ao acidente do trabalho típico com resultado morte devem ser examinadas sob o enfoque da responsabilidade objetiva da empregadora (art. 927, parágrafo único, do Código Civil c/c art. 7º, caput, da Constituição Federal), a qual prescinde demonstração do elemento culpa ou dolo do empregador, bastando a comprovação do nexo de causalidade entre a conduta e o dano”.
Texto: Gilberto Bonk Junior / Ascom TRT-PR
Fotografia: iStock / William Luque