Um ano atrás, contei nesta coluna sobre mais um episódio da persistente novela brasileira dos adicionais por tempo de serviço, os quinquênios. Trata-se de acréscimo ao pagamento de magistrados (com reflexo em outras carreiras da Justiça), apenas em razão da passagem do tempo, sem vinculação com desempenho e sem limitação ao teto do funcionalismo, hoje em R$ 44.008,52.
Naquela ocasião, o corregedor nacional de Justiça, Luis Felipe Salomão, havia mantido decisão do Conselho da Justiça Federal (CJF) para pagamento de quinquênios a magistrados federais. O caso foi denunciado ao TCU (Processo 030.305/2022-5). Decisão cautelar do ministro Jorge Oliveira, confirmada pelo plenário, suspendeu todos os efeitos do restabelecimento do adicional. O TCU considerou a vantagem ilegal e ponderou seu potencial dano às contas públicas, com repercussão na base de cálculo de outras verbas conectadas à remuneração, além suscitar o mesmo pedido em outras carreiras.
Fim da história? Longe disso.
Em 20 de dezembro de 2023, nas vésperas do recesso judicial, em Mandado de Segurança impetrado pela Associação dos Juízes Federais do Brasil, o ministro do STF Dias Toffoli cassou a decisão do TCU. A decisão fundamentou-se na separação de Poderes. Para o STF, o TCU ultrapassou suas competências e ingressou na seara exclusiva do Judiciário.
Isso porque o Judiciário, ao contrário dos demais Poderes, tem caráter nacional, o que justificaria que o CNJ exercesse controle financeiro sobre a magistratura federal e estadual. Acima do CNJ estaria apenas o STF, jamais o TCU, cuja competência se limitaria ao controle financeiro da administração pública federal.
Ao reforçar que o TCU não tem competência nacional, o STF afasta o controle exercido sobre Conselhos Nacionais de qualquer carreira, cabendo ao TCU apenas analisar a prestação de contas do Judiciário da União, nos termos do art. 71, II, da Constituição.
O tema ainda voltou ao STF na ADPF 1108, movida pelo Partido Novo. Após voto do relator pela extinção da ação, o julgamento foi suspenso por pedido de vista do ministro Gilmar Mendes.
O STF provavelmente vai esperar o andamento do novo capítulo dessa novela: a PEC 10, que restabelece o quinquênio a juízes, promotores, procuradores da República, defensores públicos e, conforme texto aprovado na Comissão de Constituição e Justiça, membros da Advocacia Geral da União (AGU) e conselheiros dos Tribunais de Contas.
O título da coluna não é hiperbólico. A medida ameaça não apenas o orçamento público, mas aprofunda um dos maiores problemas do funcionalismo: a desigualdade entre as carreiras. Ao restabelecer gratificação desvinculada de desempenho, vai na contramão de boas práticas de gestão de pessoas.
Em um contexto em que os Tribunais de Contas cada vez mais apontam para exigir qualidade e eficiência dos órgãos públicos, resta esperar que, pelo menos do ponto de vista institucional, o TCU se posicione contra a medida, contribuindo com a decisão que será tomada pelo Congresso Nacional.