A regulação, no sentido amplo, refere-se ao conjunto de instrumentos jurídico-normativos (leis, decretos, regulamentos e outras normas infralegais) do qual dispõe o governo para estabelecer obrigações a serem cumpridas pelos cidadãos, pelo setor privado e pelo próprio governo. Entendida como um instrumento de promoção do bem-estar social e econômico, pode também tornar-se um obstáculo a ele. Se mal desenhada ou excessiva pode ter efeitos negativos sobre a competitividade, impedindo a inovação, criando barreiras ao comércio, à concorrência, aos investimentos e à eficiência econômica.
A qualidade da regulação torna-se, portanto, uma ferramenta fundamental para a efetividade da ação governamental. Atuar na melhoria regulatória significa não apenas rever normas ou marcos regulatórios, mas também aperfeiçoar mecanismos de elaboração da regulação, ou seja, atuar no processo regulatório.
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Com esse objetivo, foi reformulado, por meio do Decreto nº 11.738, de 18 de outubro de 2023, o Programa de Fortalecimento da Capacidade Institucional para Gestão em Regulação (PRO-REG). Concebido a partir de uma parceria entre o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e o Governo Federal, por intermédio da Casa Civil da Presidência da República, em 2007, o PRO-REG desenvolveu uma série de ações, focadas no aperfeiçoamento do ambiente regulatório brasileiro e na capacitação voltada à melhoria da qualidade da regulação.
Após o período de implementação que durou cerca de três anos, já sem o apoio do BID, o programa passou a ter uma abordagem mais estratégica, buscando promover a efetiva adoção e sistematização das melhores práticas observadas nacional e internacionalmente para a regulação de alta qualidade. Como consequência das capacidades institucionais criadas e dos avanços relevantes no ambiente regulatório brasileiro, há hoje no País um arcabouço normativo que orienta a adoção de boas práticas regulatórias. Ainda assim, há ainda um longo caminho a ser percorrido para consolidar e tornar efetiva a aplicação de tais práticas.
A iniciativa de retomada do programa veio no bojo da reestruturação do Governo Federal, a qual, pela primeira vez, previu a criação de um órgão responsável pela coordenação, supervisão e execução de ações operacionais e orientativas relativas à implementação das boas práticas regulatórias no Poder Executivo federal. Trata-se da Secretaria de Competitividade e Política regulatória do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (SCPR/MDIC).
Daí emerge a primeira grande diferença entre as duas fases do PRO-REG: a governança. Em que pese a primeira fase ter estado sob a coordenação da Casa Civil, não havia um órgão, na estrutura do centro de governo, dedicado exclusiva e sistematicamente à promoção da melhoria da atividade regulatória.
Adicionalmente, o papel do Comitê Gestor era, em grande medida, voltado ao acompanhamento da execução do programa enquanto projeto financiado por operação de crédito junto ao BID. A nova fase do PRO-REG cria uma estrutura de governança enxuta, mas que se pretende perene, competente para articular os diferentes órgãos reguladores, emitir recomendações e orientações para a implementação das boas práticas regulatórias. Fazem parte do Comitê Gestor atores importantes: Advocacia-Geral da União, Controladoria-Geral da União, Casa Civil e os Ministérios da Fazenda, do Planejamento e da Gestão e Inovação.
Dessa forma, sendo a SCPR/MDIC o braço executor do programa, a governança instituída dará a legitimidade necessária para as ações a serem implementadas, as quais serão definidas e priorizadas a partir de uma construção coletiva, democrática e responsiva nos moldes do que se espera dos processos regulatórios atuais.
Outra diferença importante diz respeito ao escopo de atuação. A primeira fase do programa teve como público-alvo as agências reguladoras, resultado do processo de reforma do Estado da década de 1990. Nessa segunda fase, o PRO-REG amplia sua atuação para órgãos da administração direta e para reguladores subnacionais. Atualmente, estão mapeados mais de 130 órgãos reguladores no Governo Federal, e mais de 20 em nível subnacional, com diferentes níveis de maturidade regulatória.
Ao prever a criação de grupos de trabalho, amplia-se o espaço de discussão da política regulatória, permitindo captar as dores e especificidades desses atores, promover a conformidade e reduzir os custos de fiscalização, além de dar a flexibilidade e a agilidade necessárias para o tratamento de temas de fronteira na regulação.
É preciso enxergar o PRO-REG como uma política pública, relevante a ponto de ter sido incluída como medida institucional do novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e no Plano Plurianual (PPA). Por este motivo, importa mapear e definir indicadores que permitam compreender o problema de forma adequada, bem como monitorar e avaliar a implementação dessa política.
Qual é o nosso nível de maturidade regulatória? Aonde queremos chegar? Os atuais instrumentos de boas práticas regulatórias são adequados para o contexto brasileiro? Apenas a partir de um diagnóstico preliminar será possível compreender onde estamos e identificar as ações necessárias para atingirmos o que se espera do ambiente regulatório do País.
A construção de uma Estratégia Nacional de Melhoria Regulatória está prevista como a primeira grande entrega do novo PRO-REG. Trata-se de dar transparência à política em todas as suas dimensões e engajar os atores. As ações incluirão o fortalecimento das capacidades institucionais para uso das ferramentas de boas práticas regulatórias, a melhoria da coordenação e do alinhamento estratégico e o aperfeiçoamento dos mecanismos de participação social.
Nesse ponto em particular, importa engajar também o setor privado, de forma a ampliar sua compreensão sobre o tema e torná-lo um ator importante no processo. Recentemente, viu-se o papel fundamental do setor industrial na construção de uma agenda regulatória de combate ao Custo Brasil, hoje sendo trabalhada no âmbito do Conselho Nacional de Desenvolvimento Industrial (CNDI).
Não se pode pensar em crescimento econômico sustentado sem pensar na melhoria da qualidade regulatória. O “Relatório de Competitividade de Investimento Global 2019-2020” do Banco Mundial aponta que o risco regulatório pode desencorajar empresas multinacionais de entrar ou expandir suas operações em um país. O efeito do risco regulatório no investimento estrangeiro direto (IED) pode superar o da abertura comercial, mostrando que uma redução de 1 ponto percentual no risco regulatório aumenta a probabilidade de um investidor entrar ou expandir em um país anfitrião em 0,5 a 2 pontos percentuais.
Portanto, atuar em prol do crescimento econômico e da geração de emprego e renda passa necessariamente por melhorar o ambiente de negócios, aprimorando o sistema de gestão regulatória, incluindo o fortalecimento institucional dos reguladores e a utilização das ferramentas adequadas por meio das quais a regulação é elaborada, implementada e revisada. Em tempos de busca pelo equilíbrio fiscal, o qual impõe limitações ao gasto público, a regulação torna-se um pilar das políticas públicas, devendo ser eficiente, atingindo os objetivos a que se propõe e sem onerar o Estado e a sociedade. É nesse contexto que se insere o novo PRO-REG.