As últimas postagens de Guilherme Boulos nas redes sociais se direcionam ao eleitor paulistano. O deputado federal do PSol tem percorrido temas sensíveis na trincheira virtual e feito críticas diretas ao atual prefeito e pré-candidato à reeleição Ricardo Nunes (MDB), seja no combate à dengue, à falta de ações para desmobilizar a cracolândia e às obras que atrapalham o trânsito na cidade.
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A mira ajustada não se explica apenas pela discordância ao modelo de gestão. A última pesquisa Datafolha, aponta um empate técnico entre os dois candidatos, que lideram a preferência de votos até aqui em São Paulo: Boulos tem 24% contra 23% de Nunes.
Ao analisar a taxa de conhecimento dos eleitores sobre os candidatos, Nunes têm se tornado cada vez mais conhecido, o que fez o psolista elevar o volume das críticas para conter esse avanço ainda na pré-campanha. De agosto do ano passado para essa rodada, a taxa dos que dizem o conhecer muito bem saltou oito pontos percentuais, de 24% para 32%. Já a de Boulos, foi de 31% para 34%.
“A rede social hoje é o espaço que tenho para colocar minhas ideias. É uma batalha de Davi contra Golias, porque o atual prefeito tem, só no último ano, R$ 400 milhões em propaganda. Tem a máquina na mão. Então, acaba sendo, nesse momento, um jogo pouco igual. E ainda assim estamos em primeiro lugar nas pesquisas, o que expressa um sentimento de mudança da cidade. A cidade tem esse sentimento. A linguagem de rede é uma linguagem mais solta, mais leve. Sobretudo para conversar com a juventude”, disse Boulos, em entrevista por telefone ao JOTA.
Embora, pela lei eleitoral, ainda não possa oficializar sua candidatura, Boulos tem feito esforço, usando uma linguagem bem-humorada, para popularizar seu nome antes do pleito de outubro.
Em um vídeo, o pré-candidato, de 42 anos, aparece tentando descobrir qual o melhor pastel de São Paulo; em um segundo, se declara corintiano – time de maior torcida no estado –, mas se diz disposto a conversar com palmeirenses, são-paulinos e santistas “para pensar uma cidade melhor”.
Esta é a segunda vez que ele lança seu nome à Prefeitura da maior cidade do país. Na primeira, em 2020, teve uma votação surpreendente, chegou ao segundo turno, mas foi derrotado por Bruno Covas (PSDB) – que faleceu em maio do ano seguinte, possibilitando a ascensão de seu vice, Ricardo Nunes, ao cargo.
O tucano teve 59,38% dos votos, contra 40,62% de Boulos. Em números absolutos, no segundo turno, o psolista teve mais de 2 milhões de votos (2.168.109), o que o catapultou como uma liderança da esquerda na capital paulista, a ponto de desbancar o PT na configuração da cabeça de chapa.
Pela primeira vez desde que foi fundado, em 1980, o Partido dos Trabalhadores não terá candidato à prefeitura de São Paulo. Vai compor com Boulos, indicando Marta Suplicy, prefeita da cidade entre 2001 a 2005, como vice.
“Entre a minha primeira campanha e essa é um cenário bem diferente no país e na cidade. Vamos lembrar que em 2020, Bolsonaro era presidente do Brasil e o Lula estava inelegível. Em 2024, Lula é o presidente e Bolsonaro está inelegível. É um cenário inverso do ponto de vista da conjuntura nacional. E esse cenário favorece o campo progressista”, analisa Boulos.
“Localmente, com todas as dificuldades, diferenças e problemas que eu tivesse com o Bruno [Covas], ele era um cara do campo democrático. Ele não se aliou ao bolsonarismo. Ele não tinha nenhum passivo de escândalos de corrupção. Diferente do atual prefeito, que fez uma aliança sólida com Bolsonaro, que é muito perigosa para a cidade, e, ao mesmo tempo, passou três anos sem fazer absolutamente nada e agora, às vésperas da eleição, tenta tocar obras sem planejamento numa perspectiva eleitoreira”, completa.
Eleição nacionalizada, desgastes e problemas reais
Pelo discurso e atitudes, Guilherme Boulos indica apostar na nacionalização da campanha municipal como um de seus trunfos contra seu principal oponente. Em entrevista ao JOTA, o deputado disse que quer discutir a cidade, citando questões fundamentais como “transporte público, saúde, segurança urbana e moradia”, mas também classificou como “inevitável” extrapolar pontos para além das fronteiras de São Paulo.
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“Estamos falando da maior cidade do Brasil. Da cidade mais rica da América Latina. Então, esses temas são inevitáveis. E, ao contrário da impressão que se tem, que São Paulo é bolsonarista, a última pesquisa do Datafolha mostrou que 61% das pessoas não votariam no candidato apoiado por Bolsonaro. Então, existe um campo amplo para a gente dialogar. São Paulo é uma cidade democrática que não se curva a projetos desumanos, como o de Bolsonaro.”
Uma das estratégias de Boulos é associar Nunes a Bolsonaro. O atual prefeito esteve no início de junho em almoço com Bolsonaro, que emplacou o coronel Mello Araújo (PL) a vice na chapa do emedebista. Ainda assim, Nunes evita cravar a relação próxima com o ex-presidente. “Minha relação com Bolsonaro é e sempre foi de respeito. É importante destacar que padrinho político não governa, seja para quem for o candidato”, disse o prefeito ao JOTA.
“Quando começar a campanha de fato, aí as pessoas vão saber a ligação dele [Ricardo Nunes] com o Bolsonaro. Porque hoje boa parte da cidade ainda não sabe. Aí o jogo começa. Na pré-campanha, ainda é o momento de treino. A partir de agosto começa o jogo eleitoral propriamente dito”, aposta Boulos.
O psolista também destaca o recente desempenho eleitoral da esquerda em São Paulo. “Aqui, o Lula ganhou [em 2022 para presidente], o Haddad ganhou para o governo [de São Paulo, em 2022]. E eu fui o deputado federal mais votado na cidade [também em 2022]”, justifica.
E foi justamente no espectro nacional, como deputado e aliado de Lula, que Boulos teve seu primeiro desgaste da pré-campanha. No início de junho, como relator do processo que pedia a cassação de André Janones (Avante-MG), um dos principais apoiadores de Lula nas eleições de 2022, por suspeita de “rachadinha”, Boulos apresentou parecer no Conselho de Ética em defesa do arquivamento da ação. O parecer foi aprovado por 12 votos a 5, e a denúncia arquivada. “O Guilherme Boulos enterra hoje a pré-candidatura dele a prefeito de São Paulo”, sentenciou após a sessão o também pré-candidato a prefeitura Pablo Marçal (PRTB).
Em sua defesa, Boulos argumentou que não estava em discussão o mérito da rachadinha, mas questões processuais. “Não há justa causa, pois não há decoro parlamentar, se não havia mandato à época — o que foge do escopo, portanto, do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar”, justificou.
Sobre os problemas reais da vida urbana, o método vai ser mostrar que, embora seja uma cidade rica, São Paulo enfrenta problemas, que serão atribuídos à atual gestão.
“São Paulo tem R$ 30 milhões em caixa, no maior orçamento da história da cidade. Você tem R$ 30 milhões em caixa e 53 mil pessoas moram na rua. Tem dinheiro sobrando e as UPAs estão superlotadas. Falta médico nas periferias e existe uma fila enorme de espera para um exame. Tem dinheiro sobrando em caixa e o índice de segurança pública é preocupante. A Guarda Municipal de São Paulo tem um efetivo menor que o Rio de Janeiro. São Paulo não precisava estar enfrentando essa situação pelas condições privilegiadas pelos recursos disponíveis”, pontua Boulos.
Aceno de Boulos a Tabata Amaral
Desde a promulgação da Constituição de 1988, com exceção de 2016, quando Doria saiu vitorioso da disputa e impediu a reeleição de Fernando Haddad, a eleição em São Paulo sempre foi decidida em dois turnos. Jogando com essa condição histórica, Boulos já faz acenos a Tabata Amaral (PDT), na busca por diálogo em uma eventual prorrogação da corrida eleitoral.
Em março deste ano, a pedetista criticou Boulos por excluir seu nome em um post no qual ele cita os resultados da pesquisa de intenção de voto para a Prefeitura de São Paulo. Na última Datafolha, Tabata apareceu com até 9% das intenções de votos.
À época da postagem, Boulos optou por não rebater as críticas. Questionado pelo JOTA sobre uma possível aliança com a deputada, ele disse que “seria desrespeitoso falar isso agora”, e ressaltou que o segundo turno deve ser discutido no momento certo. No entanto, fez questão de elogiar a candidatura de sua adversária.
“Acho que a Tabata ajuda a qualificar o debate. O atual prefeito faz uma discussão muito agressiva. Como ele não tem o que mostrar, em cada entrevista, são três ataques, três mentiras a meu respeito. Ele rebaixa muito o nível do debate. E acho que a Tabata ajuda a qualificar e discutir a cidade, que é o que eu quero fazer.”
Em 2020, Boulos recebeu o apoio do PT e do PCdoB na disputa contra Covas, mas não avançou em partidos mais ao centro, o que pode ter atrapalhado na conquista de votos entre outras faixas etárias, de renda e classes sociais.
Quem é Guilherme Boulos
Guilherme Castro Boulos é bacharel em filosofia e coordenador do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST). Nascido na capital paulista, filho de pais médicos, se tornou conhecido na militância política durante as manifestações em torno da Copa do Mundo de 2014.
Em 2017, foi preso por descumprir uma ordem judicial de reintegração de posse no bairro de São Mateus, Zona Leste de São Paulo. Foi solto no mesmo dia.
No ano seguinte, foi candidato à Presidência da República pelo PSol. Ficou em décimo lugar, com 0,58% dos votos, entre 13 candidatos, na disputa que consagrou Jair Bolsonaro no cargo.
Em 2020, disputou a eleição em São Paulo. Chegou ao segundo turno. Em 2022, foi eleito deputado federal – cargo que exerce hoje – com mais de um milhão de votos. Essa foi a maior votação em São Paulo e a segunda maior do país naquele ano.