No âmbito da saúde suplementar, os precedentes judiciais são tema constante de debate por sua importância na garantia da segurança jurídica, tanto para os usuários dos planos de saúde quanto para as operadoras. Em um ambiente onde a previsibilidade é um dos fatores mais importantes para mensurar riscos e custos assistenciais, assegurar a observância dos precedentes dos tribunais superiores torna-se uma das missões essenciais dos advogados que atuam nesse setor.
Não é incomum que, mesmo diante de um tema pacificado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), juízes de primeiro grau deixem de cumprir o precedente em casos análogos, oferecendo soluções que muitas vezes estão em direta dissonância com o entendimento consolidado.
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Um exemplo claro dessa problemática envolve o fornecimento de medicamentos à base de canabidiol. O STJ já consolidou o entendimento de que as operadoras não são obrigadas a fornecer medicamentos de uso domiciliar, como aqueles à base de canabidiol, exceto quando previsto no rol obrigatório da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Contudo, muitos juízes de primeira instância continuam determinando o custeio desses tratamentos, em desacordo com o precedente.
Esse cenário não só gera prejuízos financeiros imediatos para as operadoras, que, na maioria dos casos, não conseguem reaver os valores já despendidos, como também resulta no aumento dos custos assistenciais, que acabam sendo repassados aos beneficiários na forma de reajustes das mensalidades.
Esse ciclo é um dos fatores que contribuem para o aumento da judicialização, uma vez que beneficiários podem ser incentivados a buscar decisões favoráveis em primeira instância, ainda que os tribunais superiores tenham pacificado um entendimento contrário.
Nos debates envolvendo temas relacionados à saúde suplementar e à judicialização, é possível perceber uma crescente sensibilização do próprio Judiciário sobre o impacto de sua atuação na dinâmica do setor. Muitas vezes, as decisões conflitantes de instâncias inferiores acabam por retroalimentar a judicialização, criando um ciclo vicioso que afeta negativamente tanto as operadoras quanto os beneficiários.
Importantes juristas, como o ministro Antônio Saldanha e o ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, têm ressaltado a importância de os juízes observarem com rigor os precedentes, especialmente em matérias pacificadas pelos tribunais superiores.
A falta de observância dos precedentes judiciais compromete a segurança jurídica e pode resultar em decisões conflitantes, enfraquecendo a uniformidade e previsibilidade que essas decisões deveriam promover no sistema judiciário. Sua correta aplicação é essencial para estabilizar as relações contratuais, permitindo às operadoras um planejamento mais eficiente e fundamentado.
Além disso, essa prática assegura a proteção dos direitos dos beneficiários de maneira consistente e previsível, alinhando os interesses das partes envolvidas e promovendo a confiança nas decisões judiciais e na regulação do setor.
Para as operadoras, a aplicação consistente dos precedentes é fundamental, pois proporciona um ambiente jurídico mais estável, permitindo calcular com maior precisão os custos assistenciais e os riscos associados ao cumprimento de suas obrigações. Essa previsibilidade facilita o planejamento estratégico, especialmente em um contexto em que julgamentos divergentes podem ter grandes impactos financeiros.
Quando essas diretrizes não são seguidas, as operadoras frequentemente enfrentam decisões inesperadas, como o custeio de procedimentos fora do rol da ANS, o que aumenta as incertezas. A correta aplicação das normas judiciais consolida a segurança jurídica e reduz esses riscos.
Para os beneficiários, representa garantia de proteção dos seus direitos, evitando que decisões divergentes criem um cenário de insegurança. Quando os tribunais de primeira instância ignoram precedentes estabelecidos por tribunais superiores, os beneficiários podem ser induzidos a acreditar que possuem direitos que, na realidade, já foram decididos desfavoravelmente em instâncias superiores. Isso pode gerar uma falsa expectativa e, consequentemente, estimular a judicialização desnecessária, sobrecarregando ainda mais o sistema de saúde suplementar e o próprio Judiciário.
Além disso, a inobservância dos precedentes impacta diretamente a sustentabilidade financeira das operadoras de saúde suplementar. Como as operadoras são muitas vezes obrigadas a cumprir decisões de primeiro grau até que sejam reformadas pelas instâncias superiores, acabam arcando com custos imprevistos e elevados, sem a possibilidade de reaver os valores posteriormente. Esse cenário gera um aumento dos custos operacionais, que são repassados aos beneficiários em forma de reajustes nas mensalidades, encarecendo o acesso à saúde suplementar e, por consequência, pressionando ainda mais o sistema.
A falta de uniformidade nas decisões também fragiliza a credibilidade do sistema judicial, uma vez que decisões conflitantes levam a uma percepção de instabilidade. Em um setor sensível como o da saúde suplementar, onde vidas e bem-estar estão em jogo, a previsibilidade nas decisões judiciais não é apenas uma questão financeira, mas também um pilar fundamental para a confiança no sistema como um todo.
Portanto, a inobservância dos precedentes traz uma série de consequências prejudiciais, desde o aumento da judicialização e dos custos assistenciais até a fragilização da segurança jurídica e da confiança no sistema de saúde suplementar. A aplicação adequada dos precedentes é essencial para manter o equilíbrio no setor, garantindo decisões consistentes e justas, que beneficiem tanto operadoras quanto beneficiários.
Em que pese o cenário de constante desafio, é possível perceber sinais de avanço no reconhecimento da importância de respeitar os precedentes judiciais. O próprio Judiciário, em especial os tribunais superiores, têm se mostrado mais sensíveis à necessidade de padronizar decisões e reduzir a inconstância”.
Um exemplo disso é o fortalecimento do mecanismo de repercussão geral no Supremo Tribunal Federal (STF) e o recurso repetitivo no STJ, que visam uniformizar a interpretação de questões recorrentes e, com isso, orientar os magistrados de instâncias inferiores a seguir os entendimentos já consolidados. Embora o processo seja gradual, essa prática tem potencial para mitigar a judicialização excessiva e trazer maior segurança jurídica para o setor de saúde suplementar.
Perspectivas futuras indicam a necessidade de melhor disseminação da jurisprudência consolidada entre os magistrados, conforme os últimos Enunciados do CNJ. Eles reforçam a importância de decisões embasadas em precedentes e evidências científicas, recomendando o uso do NAT-Jus como apoio técnico, tanto em questões de saúde pública quanto de saúde suplementar. Além disso, sugerem uma maior integração do Judiciário com órgãos técnicos e a ANS, garantindo mais precisão nas decisões.
A judicialização excessiva, frequentemente alimentada pela inobservância dos precedentes, cria um ciclo prejudicial que compromete a confiança no Judiciário e no próprio sistema de saúde suplementar. No entanto, há um movimento crescente de conscientização dentro dos tribunais sobre a importância de respeitar os entendimentos consolidados pelas instâncias superiores.
Esse avanço, aliado a recomendações como a utilização do NAT-Jus e à aproximação com órgãos técnicos e a ANS, representa uma evolução promissora na busca por decisões mais técnicas e bem embasadas.
Portanto, a aplicação consistente dos precedentes judiciais não é apenas um imperativo legal, mas uma ferramenta indispensável para garantir um sistema de saúde suplementar mais justo, eficiente e sustentável, onde o equilíbrio entre os direitos dos beneficiários e a capacidade das operadoras de oferecer serviços de qualidade sejam preservados.