O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, mostrou que está no seu pior momento no governo e que a meta de zerar o déficit, como diz o ditado, “subiu no telhado”. Em uma entrevista após novo encontro com o presidente, Haddad se mostrou irritado com as perguntas sobre a manutenção da meta fiscal, não foi taxativo em nenhum momento sobre isso – ao contrário de outras ocasiões no passado –, e ameaçou antecipar medidas tributárias para elevar a arrecadação – para variar, sem dizer quais.
A fala de Haddad mostra que o debate em torno da possibilidade de mudança da meta, de fato, avançou muito no governo e que ele está ficando isolado nessa posição de defesa do déficit zero. Sintomática não foi só a irritação dele diante das diversas perguntas que teimavam em arrancar uma frase enfática sobre a manutenção do objetivo, mas também uma das respostas: “A minha meta está mantida, vou buscar de todas as maneiras justas e necessárias”.
Como a meta não é dele, e sim do governo – sancionada pelo Congresso –, a fala de Haddad demonstra que, na queda de braço com Rui Costa (Casa Civil) e outros membros da ala política, o desfecho caminha para ser desfavorável ao que quer o titular da Fazenda.
Na entrevista, o ministro centrou foco em dois problemas para a arrecadação: a questão da subvenção para investimentos, que segundo ele, neste ano, custará R$ 200 bilhões em arrecadação; e a decisão do STF em 2017 de retirar o ICMS da base do PIS/Cofins.
Nesse segundo tópico, Haddad usou um argumento que não faz sentido para sua agenda fiscal. Disse que o tributo foi cobrado pelas empresas dos seus compradores, mas com a decisão do STF, a devolução seria para as empresas e que isso seria um enriquecimento indevido. Citou uma empresa de cigarro que sozinha pediu ressarcimento de R$ 4,8 bilhões. O curioso disso é que, se a empresa repassasse essa devolução para seus clientes, o impacto fiscal seria o mesmo. Além disso, as projeções da Receita para a arrecadação já consideram a exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS/Cofins, algo que, como ele lembrou, ocorre há cinco anos. A pauta que Haddad colocou nesse tópico simplesmente não se sustenta fiscalmente.
No caso do ICMS na base de cálculo, Haddad disse que o impacto não estava no anexo de riscos fiscais do PLOA. Não é verdade. Constava em R$ 47 bilhões para este ano, apesar de ele, no início das discussões do assunto, há alguns meses, falar em R$ 90 bilhões – e agora dizer que é R$ 200 bilhões.
Segundo ele, Lula pediu que apresentasse esses dados aos líderes partidários em uma reunião com o próprio presidente, que ele quer fazer ainda nesta semana. Até sexta-feira, lideranças partidárias do centrão não apostavam que a fala do presidente da República teria impacto sobre as negociações do pacote arrecadatório.
A coletiva do ministro, no entanto, sinalizou que a falta de apoio interno do governo à manutenção do déficit zero, em 2024, pode prevalecer mesmo em um cenário de aprovação das medidas, principalmente a subvenção do ICMS. Até porque, o que parece claro é que o enfraquecimento de Haddad na perseguição do objetivo se deve a uma realidade objetiva: falta dinheiro para as demandas políticas, e o quadro não deve mudar mesmo em um provável cenário de aprovação que limite aplicação da subvenção do imposto estadual por parte dos parlamentares.
A entrevista do ministro foi desastrosa. Serviu para confirmar as piores leituras sobre a declaração de Lula e mostrar que Haddad ainda pode até estar com mandado dado pelo presidente, mas que a confiança do chefe diminuiu. Haddad esperneou com a pergunta, mas, na prática, a entrevista dele reforçou os riscos de que a mudança da meta fiscal é mais uma questão de “quando” do que de “se”.