Por unanimidade, a 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, nesta terça-feira (18/6), receber a denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR), em maio, para tornar réus os irmãos Domingos e Chiquinho Brazão, o delegado Rivaldo Barbosa e o ex-policial Ronald Paulo de Alves, acusados de planejar o assassinato da vereadora Marielle Franco e de seu motorista, Anderson Gomes, em 2018.
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Os ministros Flávio Dino, Cristiano Zanin, Luiz Fux e Cármen Lúcia acompanharam integralmente o voto do relator do Inq 4954, o ministro e presidente da 1ª Turma, Alexandre de Moraes.
Segundo Moraes, a PGR expôs de forma ”compreensível” todos os requisitos exigidos e o discurso acusatório permite de forma lógica a total compreensão das imputações formuladas contra todos os denunciados.
Durante a análise do inquérito, Moraes também afastou as alegações das defesas sobre a ausência de competência do STF para discutir se a denúncia da PGR possuía elementos suficientes para a abertura de um processo penal.
”Quero ressaltar que esse tema já foi tratado no momento do referendo da prisão. E, aqui, relembro a todos que os denunciados presos não estão presos só por uma decisão monocrática desse relator”, declarou Moraes. Desse modo, declarou que há, por conexão, a competência do Supremo para analisar a denúncia da PGR. ”Há conexão patente, conexão teleológica, conexão probatória em relação a todas as infrações penais, inclusive em relação à imputação dos dois homicídios qualificados consumados e de uma tentativa de homicídio qualificado”, afirmou.
Com a decisão do STF, agora o processo entrará em fase de instrução, que envolve a coleta de provas, depoimentos de testemunhas e interrogatórios de todos os acusados.
Delação premiada
Na leitura de seu voto, Moraes rebateu as críticas dos advogados de defesa contra a delação premiada de Ronnie Lessa, assassino confesso de Marielle e Anderson. Segundo o ministro, a colaboração premiada não é a prova em si, mas um meio de obtê-las. Além disso, afirmou que existem dados de documentos e testemunhos que sustentam as declarações proferidas.
Assim, ressaltou não se permitir a condenação com base somente na colaboração premiada, visto que a jurisprudência e a legislação vão além, não só permitindo o recebimento de uma eventual denúncia com base apenas no que foi dito na delação premiada. ”Entendo aqui que há a presença de justa causa para o recebimento de denúncia, porque a colaboração foi corroborada por outros elementos probatórios que trazem indícios de autoria suficientes para o recebimento da denúncia”, pontuou.
Por isso, externou sua preocupação com uma possível extinção da delação premiada, em menção ao Projeto de Lei (PL) 4372/2016, que invalida a homologação da colaboração de réu preso. De acordo com Moraes, o país está diante de um momento de ataque direto ao instrumento, em que se é defendida, segundo o ministro, a sua extinção.
Na visão de Moraes, a delação é um dos principais mecanismos de combate à corrupção existentes no país. Na avaliação dele, esse meio é essencial para desvendar esquemas que envolvem altos escalões do poder, o que permite que acusados ou indiciados possam colaborar com a justiça em troca de benefícios – como redução penal.
”O Brasil deu um avanço no combate ao crime organizado graças ao instituto da colaboração premiada. Nós podemos gostar ou não do método, mas que é um instituto que no mundo todo tem grande sucesso, tem, e a legislação brasileira já é suficiente para evitar abusos”, destacou.
Denúncia da PGR
”O peculiar modo de atuação das milícias fluminenses, com ocupação territorial permanente, favorece o modelo de negócios imobiliários dos irmãos Brazão. Nos territórios controlados por milicianos, apenas candidatos apoiados por eles estão autorizados a exercer atos de campanha eleitoral. A contrapartida exigida pelos grupos criminosos é de que, uma vez eleitos, esses aliados defendam seus ilícitos interesses junto às instituições de Estado”, afirmou Luiz Augusto Santos Lima, subprocurador da República, durante a leitura da denúncia.
Foram denunciados por homicídio qualificado mediante recompensa, tortura e emboscada: Domingos Brazão, Chiquinho Brazão, Rivaldo Barbosa e Ronald Pereira. Além disso, os irmãos Brazão e Robson Fonseca foram denunciados por organização criminosa.
“Os três homicídios foram praticados mediante promessa de recompensa e por motivo torpe, com o emprego de recurso que dificultou a defesa dos ofendidos e por meio de que resultou perigo comum, circunstâncias que eram de conhecimento de todos os coautores e partícipes. Por fim, os homicídios contra Anderson Pedro Matias Gomes e Fernanda Gonçalves Chaves foram praticados com o objetivo de assegurar a impunidade do crime contra Marielle Francisco da Silva”, diz a PGR.
A denúncia explica porque Marielle se tornou um problema para os irmãos Brazão. De acordo com o documento, Domingos e Chiquinnho possuíam interesse econômico em normas que facilitassem a regularização do uso e da ocupação do solo, especialmente em áreas de milícia e de loteamentos clandestinos no Rio, área em que Marielle atuava. Leia a íntegra da denúncia.