Fazenda quer tributação mínima global este ano, e empresas temem aumento de carga

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Além da regulamentação da reforma, o governo deve apostar, ainda este ano, em outras duas relevantes mudanças tributárias: o estabelecimento de uma tributação mínima global de 15% e a atualização das regras de Tributação em Bases Universais (TBU). As alterações, que podem vir via projeto de lei (PL) ou medida provisória (MP), impactam principalmente companhias com controladas ou subsidiárias fora do país, que temem aumento de carga tributária.

Mesmo com uma alíquota de IRPJ e CSLL de 34% no caso de empresas no Lucro Real, companhias temem elevação do total a pagar de tributos pelo fato de as mudanças estudadas seguirem regras específicas alinhadas pela OCDE. Assim, contribuintes com benefícios da Sudam e da Sudene ou que possuem valores altos a deduzir, como os decorrentes de ágio, juros sobre capital próprio ou subvenções de ICMS, se preocupam com a possibilidade de ter de pagar um adicional para chegar aos 15%.

Por outro lado, há pouca margem de manobra no cenário atual. Isso porque mais de 40 países já aderiram às novas regras e poderão cobrar o diferencial caso identifiquem que empresas no Brasil pagam menos de 15% de Imposto de Renda. “É um imposto que se eu [Brasil] não cobro, vai ser cobrado em algum outro lugar”, define Victor Polizelli, professor do IBDT e sócio do KLA Advogados.

Beps

Em relação à tributação mínima, a ideia do governo é alinhar o Brasil ao que define o chamado Pilar 2 do BEPS (Base Erosion and Profit Shifting), iniciativa da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). A diretriz prevê uma tributação mínima global de 15% de Imposto de Renda a todas as empresas com faturamento anual acima de € 750 milhões.

A proposta tenta garantir, a nível global, uma concorrência justa entre companhias, fechando brechas para planejamentos tributários abusivos e impedindo que multinacionais sejam pouco tributadas.

As regras estabelecidas pela OCDE permitem que as empresas que forem tributadas a menos de 15% e tiverem, por exemplo, controladas ou subsidiárias em países que obedecem às diretrizes do Pilar 2, sejam cobradas pela diferença na jurisdição onde estão localizadas essas controladas. Hoje, além da União Europeia e do Reino Unido, aderiram às regras países como Canadá, Austrália, Nova Zelândia, Japão, Coreia do Sul, Emirados Árabes, Colômbia e África do Sul.

As diretrizes estudadas pelo Brasil possibilitarão que as companhias brasileiras paguem um adicional caso sejam tributadas a menos de 15%. Caso contrário, as empresas poderão ser cobradas por outros países. “Terão direito a uma tributação primária, antes de levar esse direito para onde está residente a última controladora, as jurisdições onde há a tributação inferior a 15%”, sintetiza a advogada Bruna Camargo Ferrari, sócia do Lobo de Rizzo Advogados e professora da pós graduação lato sensu da FGV Direito SP.

O problema para o Brasil, entretanto, é que as regras feitas pela OCDE não dialogam necessariamente com as bases de cálculo estabelecidas para o IRPJ e para a CSLL. Isso significa que, mesmo pagando uma carga corporativa de 34%, pode ser considerado, para fins de tributação mínima global, que as empresas estão sujeitas a uma alíquota inferior a 15%.

Tributaristas apontam que empresas da Sudam e da Sudene, por exemplo, têm motivos para se preocupar. Isso porque a legislação prevê uma redução de 75% do IRPJ para essas companhias, deixando-as perigosamente perto do mínimo de 15%. O benefício fiscal é voltado a empresas do Nordeste e da Amazônia Legal.

Outra situação que preocupa empresas são os abatimentos da base do IRPJ e da CSLL. Companhias com altos valores de dedução, como os decorrentes de amortização de ágio, juros sobre capital próprio (JCP) ou subvenções de ICMS, podem, na prática, ficar abaixo dos 15%.

“Quanto mais incentivo fiscal se confere em um país sobre a renda, menor vai ser a alíquota efetiva das controladas que estão naquela jurisdição, e com isso teria uma maior diferença para chegar ao mínimo global de 15%”, afirma Ferrari.

Mesmo com o temor de aumento de carga, especialistas apontam que há pouco a fazer em um cenário de adesão de um número tão grande de países às regras do Pilar 2. Isso porque, se o Brasil não passar a cobrar o imposto mínimo, outros países vão poder cobrá-lo em suas jurisdições. 

“É impossível lutar contra isso. Como há uma adesão grande dos países, [o Brasil] tem mais a ganhar se alinhando do que tentando inventar uma coisa diferente no nível legislativo ou tentando deixar isso para uma disputa”, diz Polizelli.

TBU

Em relação à Tributação em Bases Universais (TBU), o debate gira em torno da possibilidade de tributação de todos os rendimentos e ganhos de capital de uma empresa multinacional, independentemente do país em que foi gerado, no país de domicílio da companhia — no caso, no Brasil. Atualmente, de acordo com a Lei 12973/14, a consolidação é possível até o final de 2024.

Ao JOTA, um integrante do Ministério da Fazenda disse que a ideia da pasta é prorrogar o dispositivo ou atualizá-lo. 

Especialistas, entretanto, apontam que, com a adesão do Brasil às diretrizes de tributação mínima global, as regras de TBU, da forma como estão hoje na legislação, perdem sentido. Grosso modo, a forma brasileira não dialoga com as regras da OCDE, e necessitaria de ajustes.